Leia a redação do aluno que tirou mil no Enem citando autores incomuns
Matheus citou um pensador brasileiro, um esloveno e outro austríaco em sua redação do Enem. E garante: o repertório vale para qualquer tema
Matheus Almeida Barros completou 18 anos há poucas semanas. Mas foi no ano passado, ainda com 17 e terminando o último ano do Ensino Médio, que garantiu a nota máxima na redação do Enem 2023. Sobre o tema “Desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil“, o estudante de Paraíso (TO) escreveu um texto avaliado como mil pela banca do exame. Detalhe: sem estar matriculado em um cursinho ou ter aulas extras de redação.
“Só as aulas [da escola] mesmo”, diz o estudante. “Inclusive, o colégio em que me formei é novo, ano passado foi o primeiro ano dele, e já no primeiro ano conseguiu um aluno nota 1000.” Matheus, que cursou o Ensino Médio na rede particular, é o dono da única nota mil em todo o estado do Tocantins.
Veja abaixo o espelho da redação do estudante e, logo abaixo, a transcrição do texto.
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Por meio do seu livro “Brasil, país do futuro” – publicado no último século – o escritor austríaco Stefan Zweig expressou a sua confiança de que a nação cresceria e se desenvolveria exponencialmente. Para além disso, nos dias atuais, a sociedade brasileira vivencia uma situação inversa, uma vez que a constante invisibilidade feminina relacionada ao trabalho de cuidado e seus impactos negativos na contemporaneidade não são características de um “país do futuro”. Desse modo, algumas negligências governamentais impulsionam a desvalorização trabalhista de cuidado desempenhado pela mulher brasileira e promovem o desenvolvimento de diversas desigualdades econômicas. Logo, tanto a inefetividade das leis direcionadas ao público feminino quanto a escassez de investimentos na educação capacitiva são suscitadores da problemática.
Em primeiro plano, é imprescindível destacar a baixa eficiência das leis relacionadas ao trabalho da mulher como um fato que potencializa a invisibilidade do esforço doméstico e de cuidados desse grupo. Nesse sentido, o escritor brasileiro Gilberto Dimenstein defende que a legislação brasileira funciona somente no papel e, na prática, é ineficiente. A partir disso, tal tese pode ser comprovada por meio da má aplicação das leis trabalhistas femininas, uma vez que tais documentos não garantem, efetivamente, os direitos fundamentais da mulher, especialmente no âmbito do trabalho, e geram uma dependência dessa parcela ao cuidado doméstico, que é amplamente desvalorizado e, muitas vezes, não remunerado. Logo, tal insuficiência do sistema legislativo promove uma exploração exagerada da população feminina no país.
Além disso, vale ressaltar, ainda, a falta de verbas destinadas à educação como um fator que agrava e desvaloriza o trabalho de cuidado exercido pela mulher brasileira. Nesse sentido, o filósofo esloveno Slavoj Zizek afirma que os políticos liberais modernos priorizam interesses mercadológicos e menosprezam atitudes que beneficiem a coletividade. Dessa maneira, verifica-se uma imprudência estatal que, por sua vez, despreza a importância da educação ao não investir na capacitação feminina, o que impede a entrada desse grupo no mercado de trabalho e obriga a mulher a realizar os desvalorizados “trabalhos de cuidado”. Com isso, atitudes que visem ampliar a qualidade do sistema educacional brasileiro mostram-se amplamente necessárias.
Portanto, vistos os fatores que impactam negativamente na valorização do trabalho de cuidado feminino, medidas são necessárias para combatê-los. Cabe ao governo federal a realização de fiscalizações legislativas e, por meio de inspeções e vistorias em residências de risco, verificar se as leis trabalhistas femininas estão sendo devidamente aplicadas, a fim de garantir a não exploração da mulher doméstica. Ademais, o Ministério da Educação deve, através do FUNDEB – o Fundo Nacional de Educação Básica – destinar investimentos às escolas, visando promover uma capacitação geral e inserir as mulheres em um mercado de trabalho justo. Somente assim, o público feminino conquistará a devida visibilidade no âmbito do trabalho.
Facilidade com texto e repertório aguçado
Para Matheus, escrever nunca foi uma dificuldade. O jovem conta que, desde pequeno, sempre gostou das aulas de gramática e texto. No Ensino Médio passou a escrever, pelo menos, uma redação por semana. “E comecei a treinar focado no vestibular mesmo a partir do segundo do Ensino Médio”, relembra.
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Nas aulas do terceiro ano, prestou uma atenção especial àquelas que eram dedicadas a repertório sociocultural. Quando o professor passava livros, filmes, pensadores e filósofos, o jovem procurava absorver o máximo que podia sobre o conteúdo. A partir disso, criou o seu próprio modelo de redação coringa.
“Eu anotava tudo e, mais importante, decorava o que achava que pudesse ser útil”, explica. Matheus foi talhando cuidadosamente seu modelo de redação que pudesse se adaptar a temas diversos, com repertórios que chamamos de coringa. Foi esse o modelo que aplicou na redação do Enem 2023.
“Eu criei o meu [modelo] da forma que eu achava que ficasse melhor, que servisse na maioria dos temas”, diz. O estudante começou a perceber que a tática funcionaria quando começou a acumular notas mil nas redações de treino, corrigidas pelo professor.
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Criando um modelo coringa
Entre os três nomes citados pelo candidato na redação do exame, Gilberto Dimenstein pode ser considerado o mais conhecido – mas, ainda assim, foge do panteão de autores popularmente citados em redações do vestibular, como Platão, Montesquieu e Sócrates. Ao lado do autor brasileiro, estão o filósofo esloveno Slavoj Zizek, e o austríaco Stefan Zweig, autor do livro “Brasil, o país do futuro“.
O uso de um repertório original, que foge dos mais citados pelos estudantes, ajudou a demonstrar para a banca o domínio cultural de Matheus, que escolheu a dedo as três referências. “Eu procurava por repertórios que falassem da negligência do Estado, porque a maioria dos temas do Enem está relacionada a isso”, afirma a respeito do critério utilizado para a seleção dos repertórios em seu modelo.
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Sonho com a Medicina
Mesmo com a nota máxima na redação, Matheus não conseguiu a tão sonhada vaga no curso de Medicina da Universidade Federal do Tocantins (UFT). Agora, estuda em um cursinho para os vestibulares de fim de ano. As dificuldades de ingressar no curso mais concorrido do Brasil não espantam o jovem, que sonha com o jaleco há anos. “Medicina é uma coisa eu sempre eu quis, desde sempre. Eu não me vejo fazendo outra coisa.”
Para o primeiro ano de cursinho, o estudante foca agora em outras disciplinas, para além de redação, uma vez que o texto deixou de ser sua maior dificuldade. “Querendo ou não, a redação já é uma área que tenho facilidade, estou focando agora em outras áreas para ver se eu aumento a minha nota esse ano.”
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Para os que vão começar a estudar redação este ano, o jovem tem um conselho: treine e construa repertório. “Treine pelo menos uma vez por semana. E estude repertórios que possam servir para a maioria dos temas. E, claro, é muito importante saber relacionar esses repertórios ao tema”, conclui.
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