Qual a diferença entre assintomáticos, pré-sintomáticos e sintomáticos?
Uma coisa já é clara: os três grupos podem, sim, espalhar o coronavírus
Bastou uma declaração da epidemiologista Maria van Kerkhove, da Organização Mundial da Saúde, em uma coletiva de imprensa essa semana para que imagens, vídeos e notícias corressem as redes sociais anunciando que pacientes assintomáticos contaminados pela covid-19 não podem transmitir o vírus a outras pessoas. A consequência mais grave da repercussão da fala é que ela passou a ser usada para endossar um discurso anti-isolamento e minimizar a gravidade da pandemia.
O burburinho foi tanto que a própria OMS precisou divulgar uma nota técnica na última terça (9) esclarecendo que a fala de Van Kerkhove foi mal colocada e que ainda existe uma incerteza sobre a taxa de contaminação por pessoas assintomáticas. O que não há dúvidas, no entanto, é que pessoas sem sintomas podem – e muito – transmitir o vírus. É isso mesmo, sem sintoma não significa, necessariamente, assintomático, e nesse texto vamos te explicar a diferença entre as três classificações feitas pela OMS em relação aos contaminados pelo novo coronavírus.
Os assintomáticos
Depois da confusão, a epidemiologista da OMS publicou um vídeo em suas redes sociais para esclarecer que na sua fala anterior ela se referia especificamente aos assintomáticos, que são aqueles pacientes que contraíram o vírus mas não apresentaram nenhum sintoma durante todo o período de desenvolvimento da doença. Ainda assim, o comentário de Van Kerkhove foi imprudente, já que sua fala, segundo a OMS, foi baseada na observação que alguns países fizeram e está longe de ser um consenso, já que existem poucos estudos sobre esse grupo.
A afirmação pode até se provar verdade no futuro, mas assim como outras especulações envolvendo o vírus novo e desconhecido é preciso ter cautela e, antes de tudo, muita pesquisa. “Vírus viáveis (com potencial para contaminar) foram isolados tanto em pessoas pré-sintomáticas quanto em pessoas assintomáticas, o que sugere que pessoas sem sintomas podem, sim, transmitir o vírus para outras”, esclareceu a nota da organização, apontando que ainda há dúvidas e contradições sobre o assunto.
Os pré-sintomáticos
Em relação ao potencial de contaminação, esse é, sem dúvidas, o grupo que merece mais atenção. Em entrevista a BBC Brasil, Natália Pasternak, pesquisadora da USP e pós-doutora em microbiologia, afirmou que as evidências até o momento apontam que o grupo “mais transmissível” é o de sintomáticos (que já manifestaram sintomas da doença), já que eles estão tossindo e espirrando o tempo todo. Mas, na prática, quem tem mais transmitido são os pré-sintomáticos. Um estudo do Núcleo em Ecologia e Desenvolvimento Sócio-Ambiental de Macaé (NUPEM), da UFRJ, aponta que eles são responsáveis por cerca de 45% das transmissões, mais que os assintomáticos e mais até do que aqueles que já desenvolveram sintomas.
Uma explicação lógica é que essas pessoas transmitem mais porque, além apresentarem cargas virais tão altas quanto de quem tem sintomas, elas ou ainda não sabem que estão infectadas, ou acreditam que, por não terem sintomas, não têm também potencial de contaminação. Isso evidencia o perigo da declaração feita por Van Kerkhove, já que muitos pré-sintomáticos poderiam se sentir seguros em circular pensando serem assintomáticos.
Ou seja, só é possível determinar se um paciente foi ou não assintomático depois de todo o período de desenvolvimento da doença e desaparecimento do vírus. Antes disso, ele pode, a qualquer momento, começar a manifestar os sintomas, o que indicaria que até então ele só estava pré-sintomático – e com alto potencial de espalhar o coronavírus por aí.
Os sintomáticos
Segundo Ashish K. Jha, diretor do Instituto de Saúde Global da Universidade Harvard (EUA), a estimativa é que 80% dos contaminados pelo novo coronavírus vão, sim, apresentar sintomas, ainda que a maioria seja leve. De acordo com a pesquisa do Nupem, da UFRJ, eles são responsáveis por 40% das contaminações, atrás apenas dos pré-sintomáticos.
Ainda assim, acaba sendo o grupo mais “monitorado” e estudado. “Muitos países não têm condições de ficar testando todo mundo e acompanhando. Como os recursos são escassos, é mais importante focar o acompanhamento nos sintomáticos. Não muda nada nas diretrizes sobre isso ou sobre isolamento social”, concluiu Natália Pasternak.