A edição de 2024 do Sisu (Sistema de Seleção Unificada) tem deixado alguns estudantes apreensivos. Como já explicamos neste outro texto, a principal mudança é que o programa passa a ser anual – ainda que selecione vagas para o segundo semestre. Uma outra novidade, porém, também chama a atenção dos inscritos: a partir desta edição todos disputam inicialmente na categoria de ampla concorrência. A mudança seria uma maneira de diminuir distorções nas categorias de cotas e é algo já presente em outros vestibulares, como a Fuvest.
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Precedentes
Em primeiro lugar, para entender de onde vêm as mudanças na classificação do Sisu é importante revisar o contexto político da legislação que está no centro disso tudo: a Lei de Cotas (Lei nº 12.711, de 2012).
Em 2022, a lei completou dez anos e, seguindo o previsto em seu próprio texto, havia chegado o momento de passar por uma revisão para aprimoramentos. A reavaliação acabou postergada e ficou para 2023 – primeiro ano de mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que, desde a campanha de reeleição, afirmou querer aumentar a quantidade de jovens de escola pública e baixa renda no ensino superior.
Assim, em novembro de 2023, depois de passar por revisão no Congresso, o presidente sancionou as novas regras da Lei de Cotas. Uma das mais importantes foi a adição da norma que determina que candidatos cotistas só devem concorrer às modalidades de reserva de vagas caso suas notas não sejam aprovadas antes em ampla concorrência (Lei nº 14.723, de 2023).
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Por que a mudança?
A mudança, que passou a valer já na edição de 2024 do Sisu, foi apontada como uma maneira de diminuir as distorções entre as notas dos estudantes cotistas. A medida promoveria dessa forma maior equidade entre os candidatos, pois aprovaria, já na ampla concorrência, o estudante cotista que obtivesse notas altas no Enem – liberando vagas nas categorias de cotas.
Na prática, um dos motivos que levou à mudança na distribuição de vagas foi o desempenho da modalidade de estudantes de escola pública. Observando as notas de corte dos cursos mais concorridos, percebeu-se que as notas deste grupo eram muito semelhantes às de ampla concorrência. Em Medicina na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), campus da capital, por exemplo, a diferença era menos que dez pontos: 825,85 em ampla concorrência, e 816,77 na modalidade de escola pública.
Para professores e especialistas, o perfil destes alunos era quase sempre o mesmo: vinham de escolas públicas de ponta, como Institutos Federais, escolas técnicas, colégios militares e colégios de aplicação. Isto é, ainda que fossem estudantes de escola pública, eram alunos de escolas que não representavam a imensa maioria da rede pública de ensino. Suas notas mais altas aumentavam desproporcionalmente a régua interna da modalidade, diminuindo as chances de estudantes que tivessem resultados mais próximos dos da maioria.
Assim, com cotistas donos das notas mais altas já sendo aprovados em ampla concorrência, as modalidades de cotas ficam mais suscetíveis a receberem candidatos que realmente necessitam do benefício compensatório – ou seja, de menor renda e egressos de escolas públicas mais vulneráveis.
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E como fica a ampla concorrência?
Se você é um aluno que não se enquadra em nenhuma modalidade de cotas, pode estar temendo pelo aumento da concorrência – e, de fato, a disputa tende a se acirrar nessa categoria com a entrada de mais gente. No entanto, na maior parte dos casos, os únicos antes cotistas com chances reais de serem aprovados em ampla concorrência são os estudantes de escolas públicas que apresentam desempenho semelhante aos advindos da rede particular. Ou seja, a disputa vai ser entre candidatos de notas semelhantes.
As mudanças no programa, que seguem os aprimoramentos da Lei de Cotas, promovem mais equidade e buscam democratizar o acesso ao ensino superior. Vale lembrar que por mais que ampla concorrência represente 50% das vagas nas universidades, o número de estudantes de escolas privadas no Brasil é limitado: segundo o Censo Escolar, apenas 17,1% frequentam a rede particular. Isso sem falar nas questões étnico-raciais: conforme o novo Censo demonstrou, a maior parte do país se declara (45,3%).
Sendo assim, a reformulação nada mais é do que uma tentativa de deixar as universidades mais parecidas com a configuração real do Brasil: com mais pessoas negras e de escolas públicas. Outras políticas compensatórias também foram incluídas nesta edição do Sisu. A renda familiar per capita de 1,5 salário-mínimo foi diminuída para um salário-mínimo, no caso das cotas para estudantes de baixa-renda. Além disso, os quilombolas passaram a compor o grupo de PPIs (Pretos, Pardos e Indígenas).
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