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“Interdisciplinaridade na 1ª fase veio para ficar”, diz diretor da Fuvest

Gustavo Monaco também comenta sobre a alta incidência de perguntas em inglês, a baixa cobrança de obras obrigatórias e tranquiliza sobre a 2ª fase

Por Juliana Morales
Atualizado em 19 dez 2022, 21h25 - Publicado em 19 dez 2022, 09h07
o diretor da Fuvest, Gustavo Ferraz de Campos Monaco
 (Leonor Calasans/IEA-USP/Reprodução)
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Desde 1977, a Fundação Universitária para o Vestibular, a Fuvest, é responsável por preparar a prova que seleciona candidatos para a maior e mais cobiçada instituição de ensino do Brasil, a Universidade de São Paulo. Ao longo dos anos, o exame construiu uma identidade bem definida e a reputação de ser, a um só tempo, conteudista, exigente e de alto nível – tal combinação acaba por influenciar escolas e cursinhos na formulação de seus currículos. Este ano, no entanto, algo mudou.

Na prova da primeira fase para o ingresso em 2023, aplicada em 4 de dezembro, muitos candidatos ficaram surpresos com o exame. As questões mesclavam conteúdos clássicos do Ensino Médio com temas mais contemporâneos, como é de praxe, mas o que chamou a atenção em relação às edições anteriores foi a preponderância da interdisciplinaridade. A prova deixou um pouco de lado a divisão tradicional por disciplinas e apostou em questões que tratam de mais de uma área do conhecimento ao mesmo tempo – como já faz a Unicamp.

Gustavo Ferraz de Campos Monaco, diretor executivo da Fuvest, afirma que esse novo modelo de prova veio para ficar. Professor titular de Direito Internacional Privado na faculdade do Largo de São Francisco, Monaco foi eleito para ocupar a direção da Fuvest em junho deste ano. Segundo ele, a banca já vinha dando indícios de que a interdisciplinaridade ganharia mais espaço na primeira fase. Direto de Portugal, onde participava de uma banca, Monaco concedeu entrevista ao GUIA DO ESTUDANTE e contou sobre os rumos que o vestibular da Fuvest deverá tomar nos próximos anos, inclusive com a consolidação do Novo Ensino Médio. Confira.

GUIA: A interdisciplinaridade na primeira fase da Fuvest 2023 foi vista como uma grande novidade em relação às edições anteriores. Essa mudança foi planejada? Ela é um projeto do vestibular da USP?

GUSTAVO MONACO: Sim, foi planejada. A Fuvest não trabalha com surpresas: ao longo das últimas edições ela já vinha dando sinais de que isso aconteceria. Em provas anteriores era comum ver, por exemplo, perguntas que misturavam Sociologia com História. Inclusive, uns dois anos atrás, se eu não me engano, apareceu uma questão deste tipo e os cursinhos não conseguiam definir se era de Química ou de Biologia.

GUIA: Por conta desta nova característica, a prova não seguiu a divisão clássica por disciplinas definida pela banca até então. Isso acabou surpreendendo alguns alunos, principalmente aqueles que tinham uma estratégia baseada justamente na resolução por disciplinas. Para o próximo ano, os candidatos devem levar isso em consideração na hora de se preparar? Essa tendência vai se consolidar?

GUSTAVO MONACO: Esse novo modelo veio para ficar. Claro que um direcionamento como este está sujeito à mudança e dependemos das bancas examinadoras. Portanto, não podemos descartar a possibilidade de aparecer, eventualmente, questões focadas em uma única disciplina. Mas, sim, a prova tende a ser ainda mais interdisciplinar daqui para frente.

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GUIA: Esse modelo de prova sem uma divisão muito categórica entre as disciplinas também vale para a segunda fase?

GUSTAVO MONACO: Ainda não. Acontece que, na segunda fase, o candidato responde questões ligadas à área de conhecimento do curso no qual ele se inscreveu. No próprio manual já diz que quem concorre para o curso de Direito fará uma prova de História, Geografia e Matemática. Diante disso, eu não posso surpreender o aluno e cobrar um assunto de Biologia, por exemplo. Então os candidatos podem ficar tranquilos: a segunda fase terá uma prova ainda ligada ao modelo tradicional, sem novidades.

GUIA: Qual é a intenção deste novo modelo de primeira fase?

GUSTAVO MONACO: Queremos que o aluno perceba que nada é estanque, ou seja, nada é 100% separado. Tudo está relacionado no nosso dia a dia, então trabalhar correlações nas questões é trazer essa realidade para a prova. Nós sempre tivemos um modelo de ensino em que o professor entra na sala de aula para falar apenas do assunto que ele domina, mas isso está mudando. E grande parte desta transformação se deve também à implementação do Novo Ensino Médio, que já traz uma visão ampliada do conhecimento.

GUIA: Falando em Novo Ensino Médio, como a Fuvest irá se adaptar a esta nova realidade?

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GUSTAVO MONACO: Certamente serão necessárias mais mudanças para o vestibular se adaptar ao modelo do Novo Ensino Médio, tanto para a primeira fase quanto também para a segunda. Mas ainda é necessário estudar, fazer testes e ver qual o melhor caminho. São planos a médio prazo, não para o ano que vem.

GUIA: A Fuvest sempre foi lida como uma prova mais conteudista. Isso ainda faz sentido? Como você vê as transformações que a prova passou ao longo dos anos?

GUSTAVO MONACO: De fato, no passado, a Fuvest era muito mais conteudista do que outros vestibulares. No entanto, esse posicionamento foi se modificando ao longo dos últimos anos. O que também não significa que o conteúdo desaparece da avaliação – ele continua ali, ainda que implícito. Mas a banca deseja ver que o estudante sabe interpretar e ter uma visão crítica daquele conteúdo. Afinal, a USP busca pessoas curiosas, que entendam que mesmo que um indivíduo seja de biológicas, ele precisa continuar conhecendo o que é mais essencial nas demais áreas.

GUIA: Assim como ocorreu na Unesp, o aumento no número de questões de inglês também chamou atenção na Fuvest deste ano. Ao todo, foram oito perguntas. A língua estrangeira vai ganhar mais peso daqui para frente? Qual a intenção por trás desse movimento?

GUSTAVO MONACO: Quando o estudante entra na universidade ele vai naturalmente se deparar com textos em inglês. Nem sempre existe uma bibliografia em português equivalente ou compatível para o professor indicar, então a pessoa precisa ter um conhecimento mínimo de interpretação de texto. Já o domínio dos textos técnicos e muito específicos das áreas, os alunos vão se aperfeiçoando ao longo da graduação. Por isso, acredito que é uma tendência clara para as universidades públicas de excelência, que têm uma inserção internacional, cobrar esta habilidade. Mas nós sabemos que o ensino de qualidade de inglês no Brasil não é universal, por isso nunca vamos fazer uma prova que metade das questões seja em língua estrangeira.

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GUIA: Por outro lado, as questões de literatura tiveram uma baixa incidência na primeira fase. Apenas três obras obrigatórias foram cobradas neste ano, o que é pouco comparada à média das últimas edições, de cerca de nove perguntas. Isso indica uma mudança?

GUSTAVO MONACO: Foi apenas uma circunstância desta edição. Pode ser que agora na segunda fase essas obras apareçam ou não. A gente nunca sabe. Mas a cobrança das obras obrigatórias continua valendo, sim. O que pode acontecer é uma alteração na indicação da lista de livros, o que é comum. Na medida do possível, tentamos dialogar com outras universidades para ver a possibilidade de uma sobreposição, assim os alunos que disputam outros vestibulares podem dedicar mais tempo para um número menor de livros.

Eu, particularmente, não acho que a lista atual de livros reflita a nossa realidade. Não estou dizendo que as obras clássicas não devam ser cobradas, mas ainda temos poucas autoras e autores negros. E já existe um discussão dentro da Fuvest para fazer um redirecionamento nesse sentido. Mais um vez: se isso for feito e quando for feito, vai ser anunciado com antecedência e com transparência para que os vestibulandos se organizem.

+ Saiba mais sobre o que esperar das obras obrigatórias na segunda fase da Fuvest

GUIA: Analisando as notas de corte, como você vê o desempenho dos estudantes na primeira fase da edição de 2023?

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GUSTAVO MONACO: As notas de corte deste ano mostram um aproveitamento bom dos candidatos. De um modo geral, não tivemos variações muito sensíveis comparando com anos anteriores. Na maioria dos casos, foi registrada uma diferença de um ou dois pontos, que pode ser resultado do comportamento da própria concorrência.

GUIA: Observamos que alguns cursos que em geral são menos concorridos apresentaram um aumento significativo na nota de corte. Em comparação com a edição passada, por exemplo, a nota de Pedagogia aumentou 11 pontos, em Letras a diferença foi de 10 pontos e em Ciências Sociais, 7. 

GUSTAVO MONACO: Como muitas questões eram de interpretação ou de aplicação de um conceito a partir do raciocínio lógico, talvez essas pessoas tenham conseguido um desempenho um pouco melhor. Essa detecção de variações maiores pode se dar até pelo perfil da profissão destes cursos citados.

GUIA: Nesta edição, já passa a valer a modalidade Enem-USP, que substituirá o Sisu no ingresso na USP. O Sisu tem uma divulgação ampla, em nível nacional, existe uma preocupação da nova modalidade não ter um alcance tão grande e ficar restrita a São Paulo?

GUSTAVO MONACO: Acredito que não teremos problema porque os estudantes não precisarão fazer nenhuma prova. Assim como a Unicamp, nós teremos uma modalidade para substituir o Sisu. No próximo ano, as pró-reitorias de graduação e de inclusão da universidade continuarão o trabalho de divulgação do Enem-USP. O que eu posso dizer é que as inscrições começaram na sexta-feira, 9 de dezembro, e já temos um número grande de inscritos, inclusive de outros estados. Isso mostra que não é algo que seja de desconhecimento dos estudantes.

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Vale esclarecer que o motivo da adesão deste novo modelo é uma questão pragmática. O Sisu estava demorando demais para fazer as chamadas e, muitas vezes, o aluno que ingressava com a nota do Enem chegava já no meio da semana de provas. Além do problema da perda do conteúdo e de avaliações, isso criava uma estigmatização entre os alunos, com brincadeiras do tipo “semana que vem chegam os do Sisu”.

+ Entenda melhor como funciona o Enem-USP

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Calendário Fuvest 2023

Lista de convocados e locais de prova da 2ª fase já disponível na Área do Candidato
Aplicação da prova da 2ª fase: 8 e 9/01
Prova de habilidade específica – Artes Cênicas: 11 a 14/01
Prova de habilidade específica – Artes Visuais: 12/01
Prova de habilidade específica – Música (ECA-São Paulo): 11 a 14/01
Prova de habilidade específica – Música (FFCLRP-Ribeirão Preto): 11 a 14/01
Lista de aprovados: 30/01
Resultado dos treineiros: 6/02
Matrícula da 1ª chamada: 31/01 a 06/02
Lista da 2ª chamada: 10/02
Matrícula da 2ª chamada: 13 e 14/02
Lista da 3ª chamada: 17/02
Matrícula 3ª chamada: 23 e 24/02
Manifestação de interesse na lista de espera: 1 a 3/03

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