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Fuvest, oito anos depois

Repórter do GUIA DO ESTUDANTE conta como foi fazer o vestibular deste ano para tentar conseguir (pra valer) uma vaga na USP

Por Ana Prado
Atualizado em 16 Maio 2017, 13h35 - Publicado em 4 dez 2014, 20h30

Entrei no curso de Jornalismo da Universidade de São Paulo (USP) em 2007 e me formei no primeiro semestre de 2013. Sim, fiquei lá por bastante tempo. É que na USP, apesar de haver uma grade básica de aulas, você fica bem livre para montá-la como quiser, respeitando as disciplinas que exigem outras como requisito. Se começar a trabalhar cedo, como foi meu caso, talvez precise pegar menos aulas. Além disso, há muitas optativas ótimas em outros cursos e a própria vivência na universidade é muito legal; logo, pelo menos entre os estudantes de humanas (não conheço suficientes pessoas de outras áreas para dizer se ocorre o mesmo), não há muita pressa em concluir a graduação no tempo mínimo.

Pois bem, eu mal saí da USP e decidi que queria voltar para ela porque acho que a gente ainda tem muita coisa pra viver junto. E, como não estava satisfeita com minha formação no Jornalismo e queria estudar outras coisas, decidi me inscrever na Fuvest 2015 – desta vez, em Psicologia. Isso quer dizer que fiz o vestibular deste ano realmente desejando passar – embora, confesso, estivesse bem insegura, considerando que a nota de corte e a concorrência para essa carreira estão altas. Mas aí eu me lembrei de quando me inscrevi em Jornalismo: marquei essa opção porque era a que eu realmente queria e não estava muito ligada em quão difícil seria passar no vestibular. Só que, quando vi a nota de corte e a concorrência, fiquei um tempo lamentando por não ter escolhido Letras ou Ciências Sociais – eu ainda queria ser jornalista, mas também me identificava com esse cursos e eles tinham concorrência bem menor. Foi o meu pai que me fez voltar à razão: “Se você quer ser jornalista e está se dando ao trabalho de fazer um ano de cursinho, então se inscreva na faculdade que realmente quer!”. Eu não fiz cursinho nenhum em 2014, mas desembolsei 145 reais para me inscrever em uma prova difícil e cansativa. De que adiantaria passar em um curso se o que eu quero é outro? Então encarei o desafio.

Mas minhas circunstâncias hoje são bem diferentes: tenho um trabalho de tempo integral, não moro mais com a família e tenho um monte de responsabilidade que não tinha antes – ou seja, tenho muito menos tempo e energia para me preparar. E não consegui estudar de verdade até o começo de novembro. As coisas mudaram porque perdi o meu pai e tirei licença do trabalho por uns dias. Para lidar com o baque, comecei a me dedicar aos estudos usando as apostilas dos tempos do cursinho (é bom ser acumulador e não se livrar de certas coisas – eu sempre soube que precisaria delas de novo algum dia). Foi a melhor coisa que poderia ter feito.

Prestar vestibular aos 26 anos é ruim porque você precisa lidar com conteúdo que não via há quase uma década, mas a maturidade e a bagagem cultural que você adquiriu com o tempo ajudam demais. Além disso, se você aprendeu mesmo o conteúdo naquela época (em vez de só decorar coisas), acho que é só uma questão de refrescar a memória. Eu achei que nunca mais ia ser capaz de resolver um problema de física na vida depois que entrei na faculdade, mas fiquei impressionada em descobrir que peguei o jeito de novo bem rápido – e ainda mais em descobrir que senti falta de lidar com esses problemas. Encarar a objetividade das ciências exatas depois de tanto tempo em humanas dá uma sensação ótima. Mas fiquei irritada com a quantidade de fórmulas. Não lembrava que eram tantas! Pode parecer que trabalhar no GUIA DO ESTUDANTE tornaria essa revisão mais fácil, mas a verdade é que isso só me deixou mais tensa: afinal, estava constantemente pensando no vestibular e não podia fugir disso nem enquanto trabalhava.

Embora tenha conseguido rever bastante coisa durante a minha licença, só consegui estudar mesmo na última semana de novembro – a que antecedia o vestibular. Tirei esse período de folga (eu tinha folgas acumuladas, tá, gente? Meu trabalho não é moleza, não) e mergulhei nos livros. Segui todas as dicas que costumo passar a vocês aqui no GE. Como tive de rever muito conteúdo em pouco tempo, mantive o foco, mas procurei respeitar meus limites. Não perdi tempo com matérias cujo conteúdo eu ainda dominava e também não me desesperei com coisas que não iria aprender em pouco tempo; tentei estudar um pouco de tudo e fiz muitos exercícios de física, matemática e química (que eram meus pontos críticos).

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Para equilibrar a ansiedade, fazia pausas regulares para tomar um ar, comer alguma coisa batendo um papo com alguém, brincar com algum aplicativo bobo no celular ou ver um pouquinho de TV – sempre com cuidado para não me distrair além da conta e acabar perdendo tempo demais nessas atividades. Eu já havia percebido em outra semana que jogar videogame, por exemplo, não era boa ideia: eu tinha dificuldade para controlar a quantidade de tempo que passava ali. Na semana final, portanto, nem passei perto dele. Sabia que tudo o que eu estudasse faria a diferença – mesmo se não fosse cobrado na prova, me deixaria mais segura – e tentei administrar meu pouco tempo disponível de um jeito inteligente.

Terminei os estudos por volta das 2h da manhã de sexta-feira para sábado (29). Obviamente não tinha estudado tudo, mas sabia que tinha feito o meu máximo e procurei me manter confiante. No sábado, véspera da prova, estava ansiosa, mas não peguei nenhum livro. Andei um pouco, encontrei meus amigos para tomar um café (nada de álcool na véspera do vestibular, né?), ouvi música e – coisa muito importante – comprei um relógio. Ninguém nunca dá essa dica, mas usar um relógio para controlar o tempo nas provas em que isso é permitido (o Enem não permite, por exemplo) é essencial. Como sempre vejo a hora no celular, parei de usar relógio e não tinha nenhum em casa, então fiquei muito feliz em encontrar um por 30 reais na Rua Augusta. Também cozinhei e deixei o almoço preparado para o dia seguinte, além de separar os documentos, materiais (peguei umas cinco canetas, caso as quatro primeiras parassem de funcionar porque é isso o que pessoas de 26 anos fazem) e alimentos que levaria para a prova (passei no mercado e peguei tudo o que tive vontade como recompensa pessoal pelo meu esforço, mas no fim só comi um chocolate na prova).

A prova

No domingo, acordei por volta das 9h da manhã e me preparei com calma. Estava ansiosa, então fiquei ouvindo música para tentar relaxar. A prova começava com questões de humanas, e isso foi ótimo para me fazer ganhar mais confiança. Mesmo assim, rolaram uns segundos de pânico em que achei que ia passar mal. “Como eu consegui sobreviver a um negócio tenso desses quando era mais nova, meu Deus?” Aparentemente, estou ficando mais covarde com o tempo. A vantagem é que você também passa a entender melhor o que está se passando com seu corpo e sua cabeça e consegue controlar melhor as emoções. “Para com isso! Você já passou nessa prova, já se formou, estudou tudo o que podia e sabe o que fazer. Que besteira!”. E essa dura que eu dei em mim mesma realmente funcionou e eu fiquei mais calma.

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Não tive dificuldade nenhuma com história, geografia e inglês, mas a prova de português foi desafiadora até para mim, que sou jornalista. Biologia não foi fácil, mas havia caído o que eu havia estudado com mais cuidado. E aí vieram física e matemática. Gente, que questões eram aquelas? Além da complexidade – definitivamente não bastava decorar fórmulas -, eu já estava cansada e com menos concentração. Havia ainda por volta de duas horas e meia, mas eu precisava preencher o gabarito. Comecei a pensar que havia passado tempo demais conferindo as questões fáceis e isso me deixou preocupada. Tentei respirar fundo e resolver o que parecia mais simples. Como bem pouca coisa naquelas provas estava simples, achei melhor preencher o gabarito com o que já tinha – e, assim, ter uma noção melhor de quantas questões faltavam.

Voltei para física e matemática e continuavam difíceis – e agora eu estava com menos tempo ainda. Pulei para a prova final, de química, e ela felizmente cobrava coisas que eu havia estudado bastante. O que me preocupava é que eu fiz a Fuvest há tanto tempo que não lembrava se era normal não saber resolver as questões. “Será que eu chutei muita coisa na época? Tinha dado tempo de resolver tudo?” Olhava para a etiqueta na minha mesa, que continha meu nome e o curso que eu havia escolhido. E ler “Psicologia” ali só me lembrava de que eu tinha que tirar uma boa nota naquela prova e que poderia ter optado por um curso mais fácil, mas nãaaao. Cheguei a pensar em desistir do Projeto USP 2015 e comecei a me ver contando para os amigos que estavam na expectativa: “Não rolou, tava muito difícil etc.”. No mês que antecedeu a prova eu tive a certeza de que era isso o que eu queria. Eu queria isso demais. Era esse o caminho que eu estava procurando, eu finalmente havia sacado. Mas, durante aquela prova, eu disse a mim mesma: “Não quero passar por isso de novo nunca mais. Se não rolar, tento fazer outra coisa.” A Fuvest é pesada demais.

Com o tempo se esgotando e a ansiedade aumentando, precisei ser objetiva: não daria para resolver tudo, então eu teria que chutar várias questões. A sacada seria tentar minimizar os danos. Como? Bom, numa prova como essa, qualquer questão que você acerte é valiosa. Então, mesmo me sentindo esgotada, me esforcei em resolver as que me pareciam mais simples e familiares, pois elas ainda poderiam me render pontos. Quando só sobraram as impossíveis, a saída foi o chute, mesmo. Marquei tudo na mesma letra porque achei que pelo menos uma ou duas eu acertaria assim e entreguei a prova faltando uns três minutos para acabar o tempo.

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Enquanto esperava o circular para ir embora (fiz a prova na USP), conheci um menino legal que me deixou um pouco mais aliviada: “Relaxa, estou no quarto ano de cursinho para prestar Medicina e até eu achei a prova difícil”. Ele me contou que foi super bem nas provas da Unesp e da Unicamp, mas que a Fuvest foi bem mais difícil. “Se alguém preparado assim achou difícil, não devo me sentir mal”, pensei. Mais tarde, professores manifestaram a mesma opinião.

Cheguei em casa tão esgotada e com tanta dor de cabeça e nas costas (olha a idade aí cobrando seu tributo – e olha que eu estava acostumada a ficar bastante tempo sentada estudando ou trabalhando) que fiquei uns trinta minutos jogada num pufe olhando para a parede. Até que a Mariana, minha editora, contou que haviam liberado o gabarito oficial. Fiquei na dúvida entre conferir na hora ou depois de encontrar meus amigos para relaxar um pouco, mas achei melhor acabar com a dúvida. Eu definitivamente não sabia o que esperar.

Conferi as respostas de humanas e minha esperança se reacendeu. Quando cheguei nas questões de exatas faltavam poucos pontos para alcançar a nota de corte. Não me saí mal em biologia e química. Ainda acertei as mais fáceis de física e matemática e, das que chutei, acertei umas duas – a operação redução de danos havia funcionado. A gente ainda não sabe qual vai ser a nota de corte deste ano, mas, aparentemente… estou dentro! Na verdade, eu me saí melhor do que quando fiz cursinho e achei isso engraçado. Por mais que eu tivesse ficado ansiosa em vários momentos, eu estava bem mais confiante em relação aos conhecimentos que possuía (a ansiedade vinha da consciência do que eu não havia conseguido estudar) e com maior capacidade de entender e dominar minhas próprias emoções. Na hora, eu me lembrei do conselho do meu pai e vi mais uma vez como ele estava certo: eu me arrependeria muito se tivesse escolhido outro curso só por ter menor nota de corte.

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A batalha ainda não acabou: agora preciso aprofundar meus estudos porque a segunda fase vem aí. É exaustivo e tenso e difícil, mas vale muito a pena ser corajoso e encarar. Esse é um daqueles desafios que, independentemente do resultado, deixam você mais forte. Eu saí achando que não tinha rolado, mas mesmo assim estava feliz por ter ido até o fim. Vestibulandos que nos acompanham aqui no GUIA, sejam fortes. E, para quem está com dúvidas sobre que caminho escolher na vida profissional, deixo uma lição importante que aprendi: sua primeira escolha não precisa ser a última. Ela não necessariamente vai determinar o caminho que você irá seguir para o resto da vida. Você sempre pode tentar outros se não estiver satisfeito com o que escolheu – só não deixe seu medo o paralisar.

 

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