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Por que Hitler odiava os judeus?

O antissemitismo tem raízes religiosas milenares - e é diferente de antijudaísmo

Por Marta Francisca Topel*
Atualizado em 20 set 2023, 14h48 - Publicado em 7 abr 2009, 00h00

Para compreender o antissemitismo – ódio aos judeus defendido por Hitler – é fundamental diferenciá-lo do antijudaísmo.

O antijudaísmo é o ódio à religião judaica como ideologia ou visão de mundo, enquanto o antissemitismo é o ódio aos judeus como nação. Entretanto, aqueles que professam o antijudaísmo acabam sendo antissemitas, uma vez que partem do pressuposto de que a religião judaica contaminou a nação que segue seus preceitos. Por sua vez, o antissemitismo desemboca no antijudaísmo, ao sustentar-se na premissa de que só uma nação racialmente inferior pôde ter criado uma religião tida como a religião do Mal.

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Origem do antissemitismo

Na Antiguidade, seitas esotéricas conceberam a religião judaica como a religião do demônio e viam os judeus como os agentes na propagação dessa religião do pecado. Essa cosmovisão foi resultado de uma crença dualista, isto é, em dois poderes criadores do universo: o Bem e o Mal, identificando os judeus com o Mal, o que os colocou no papel do mal cósmico e os viu como instrumento do demônio.

Todavia, o momento histórico no qual se entrelaçam pela primeira vez e de forma radical antijudaísmo e antissemitismo é na consolidação da visão paulina. Para o apóstolo Paulo, a revelação da Torá é uma revelação temporária, e aqueles que continuam no caminho da Torá após a chegada de Cristo são traidores. Segundo esse raciocínio, os judeus, ao rejeitarem Cristo como Messias e ao assassiná-lo, transformaram-se em agentes do Mal, no povo deicida.

Ao longo de toda a Idade Média, essa idéia foi desenvolvida e materializada pela Igreja católica. É de se destacar os cânones adotados no Concílio de Latrão (1215) que confirmavam a condenação dos judeus à servidão perpétua, proibiam sua integração na sociedade com o objetivo de impedir a contaminação dos cristãos, obrigavam o uso de signos de diferenciação nas vestes, impediam o acesso dos judeus aos cargos administrativos e os excluíam completamente da agricultura e das corporações. Essas medidas enraizaram na população um ódio milenar baseado numa ideologia demonizadora que culpou os judeus e o judaísmo pela morte de Cristo.

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O termo antissemitismo foi criado no século 19, quando as teorias religiosas que acusavam os judeus de deicídio ficaram caducas. Nesse momento, a partir de uma leitura tergiversada das teorias ligadas ao darwinismo social, o motivo para perseguir os judeus começou a ancorar-se em pressupostos biológicos.

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Assim, para Hitler, existiam três raças: as “fundadoras” ou superiores, representadas pelos povos germânicos, as “depositárias”, pelos povos eslavos, e as “destruidoras” ou inferiores, que tinham nos judeus o exemplo paradigmático.

Obcecado com o ideal de pureza racial, Hitler compreendeu a História como uma permanente luta entre as diferentes raças, na qual a raça superior devia utilizar todos os meios necessários para manter sua pureza. A essa visão histórica foi acrescentado o mito da “conspiração judaica mundial”, fortemente difundido em toda a Europa que, entre outras falácias, divulgou a ideia do poder econômico do povo judeu e do seu monopólio dos meios de comunicação. Os judeus foram transformados no bode expiatório e culpados de todos os males pelos quais atravessava a Alemanha, fazendo com que sua eliminação se tornasse um imperativo de Estado.

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Muitos ignoram que os campos de extermínio não estavam na Alemanha, mas na Europa do leste. Isso visava poupar os alemães do “trabalho sujo” e permitia aos poloneses, ucranianos e lituanos, acérrimos antissemitas de longa data, colaborar ativamente com o ideal nazista de aniquilação total dos judeus.

Nas cidades polonesas de Jedwabne, Radzilow, Wasosz e Stawinski, por exemplo, os moradores assassinaram milhares de ju-deus, sem nenhuma imposição dos ale-mães. Se algum episódio exemplifica o enraizado anti-semitismo polonês, ele é a matança de judeus depois de finalizada a guerra. O pogrom de Kielce (1946), um entre muitos, permanecerá na história polonesa como um dos maiores atos de covardia coletiva, no qual 42 sobreviventes do Holocausto foram assassinados pelos vizinhos. Por quê? Medo destes de ter de devolver, a seus donos judeus, as casas que haviam ocupado ilegalmente.

*Marta Franscisca Topel – Antropóloga e pesquisadora do Programa de Língua Hebraica, Literatura e Cultura Judaicas da Universidade de São Paulo (USP)

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