O Prêmio Nobel de Medicina de 2020, anunciado nesta segunda-feira (5), foi para os americanos Harvey Alter e Charles Rice e o britânico Michael Houghton, responsáveis pela descoberta do vírus da hepatite C. Segundo o júri, foi uma “contribuição decisiva para a luta contra este tipo de hepatite, um grande problema de saúde mundial que provoca cirrose e câncer de fígado”. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), todo ano, 70 milhões de pessoas contraem hepatite C e 400 mil morrem.
No fim dos anos 1970, Harvey Alter identificou, durante as transfusões, uma nova condição hepática diferente das já conhecidas hepatite A e hepatite B. Em 1989, Michael Houghton e sua equipe descobriram a sequência genética do vírus. A partir disso, Charles Rice pesquisou por anos como o vírus se replicava, gerando conhecimento para criar um novo tratamento eficaz no início dos anos 2010.
Além da A, B e da C, ainda existem as hepatites D e E, que também são provocadas por vírus e acometem o fígado. Essa doença, nas suas diferentes versões, provoca complicações como a cirrose e o câncer de fígado, muitas vezes levando à morte do paciente.
Entenda as características de cada uma delas, de acordo com informações do Departamento de Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis, do Ministério da Saúde.
Hepatite A
Causa: vírus RNA de fita simples positiva, que pertence à família Picornaviridae, denominado vírus da hepatite A (HAV).
Transmissão: fecal-oral (contato de fezes com a boca). A doença tem grande relação com alimentos ou água não seguros, baixos níveis de saneamento básico e de higiene pessoal. Outras formas de transmissão são os contatos pessoais próximos (intradomiciliares, pessoas em situação de rua ou entre crianças em creches) e os contatos sexuais.
Sintomas: geralmente, quando presentes, os sintomas são inespecíficos, podendo se manifestar inicialmente como fadiga, mal-estar, febre e dores musculares. Esses sintomas iniciais podem ser seguidos de sintomas gastrointestinais, como enjoo, vômito, dor abdominal, constipação ou diarreia. A presença de urina escura ocorre antes da fase em que a pessoa pode ficar com a pele e os olhos amarelados, a chamada icterícia. A coloração amarela é sinal de excesso de bilirrubina, uma substância gerada na reciclagem dos glóbulos vermelhos e que deve ser processada pelo fígado para ser eliminada na urina e nas fezes. Quando esse órgão não está funcionando bem, a bilirrubina se acumula no sangue e é depositada na pele. Os sintomas costumam aparecer de 15 a 50 dias após a infecção e duram menos de dois meses.
Prevenção: a melhor forma de evitar a doença é melhorando as condições de higiene e saneamento básico e vacinação.
Hepatite B
Causa: vírus pertencente à família Hepadnaviridae, o vírus da hepatite B (HBV).
Transmissão: o HBV está presente no sangue e em secreções, e faz da hepatite B é uma infecção sexualmente transmissível. Além do sexo, a mãe infectada pode passar a doença para o filho, durante a gestação e o parto. Também há o risco no compartilhamento de material para uso de drogas (seringas, agulhas, cachimbos) e de de materiais de higiene pessoal (lâminas de barbear e depilar, escovas de dente, alicates de unha ou outros objetos que furam ou cortam). Equipamentos de tatuagem e colocação de piercings, procedimentos odontológicos ou cirúrgicos que não atendam às normas de biossegurança, por contato próximo de pessoa a pessoa (presumivelmente por cortes, feridas e soluções de continuidade) e transfusão de sangue também podem gerar a transmissão. No caso de transfusões, têm maior risco as realizadas antes de 1993, quando novas regras de segurança na análise de sangue foram implantadas.
Sintomas: a história costuma ser marcada por evolução silenciosa, geralmente com diagnóstico após décadas da infecção. Os sinais e sintomas, quando presentes, são comuns às demais doenças crônicas do fígado e costumam manifestar-se apenas em fases mais avançadas da doença, na forma de cansaço, tontura, enjoo e/ou vômito, febre e dor abdominal. A ocorrência de pele e olhos amarelados é observada em menos de um terço dos pacientes com hepatite B.
Prevenção: a vacinação é a principal medida de prevenção contra a hepatite B. Além de usar preservativo em todas as relações sexuais e não compartilhar objetos de uso pessoal – tais como lâminas de barbear e depilar, escovas de dente, material de manicure e pedicure, equipamentos para uso de drogas, realização de tatuagem e colocação de piercings.
Hepatite C
Causa: o vírus da hepatite C (HCV) pertence ao gênero Hepacivirus, família Flaviviridae
Transmissão: a transmissão se dá com contato com sangue contaminado, pelo compartilhamento de agulhas, seringas e outros objetos para uso de drogas (cachimbos) e da reutilização ou falha de esterilização de equipamentos médicos ou odontológicos.
Outros fatores são a falha de esterilização de equipamentos de manicure, reutilização de material para realização de tatuagem e procedimentos invasivos (ex.: hemodiálise, cirurgias, transfusão) sem os devidos cuidados de biossegurança. Apesar de menos comum, pode se dar por meio de relações sexuais sem o uso de preservativos e transmissão da mãe para o filho durante a gestação ou parto (menos comum).
Sintomas: o surgimento de sintomas em pessoas com hepatite C é muito raro; cerca de 80% delas não apresentam qualquer manifestação.
Prevenção: não existe vacina contra a hepatite C. Para evitar a infecção, é importante não compartilhar com outras pessoas qualquer objeto que possa ter entrado em contato com sangue (seringas, agulhas, alicates, escova de dente etc.), usar preservativo nas relações sexuais e não compartilhar quaisquer objetos utilizados para o uso de drogas. Além disso, toda mulher grávida precisa fazer, no pré-natal, os exames para detectar as hepatites B e C, o HIV e a sífilis. Em caso de resultado positivo, é necessário seguir todas as recomendações médicas. O tratamento da hepatite C não está indicado para gestantes, mas após o parto a mulher deverá ser tratada.
Hepatite D
Causa: o vírus da hepatite D (HDV) é um RNA subvírus pequeno, esférico e incompleto, que precisa do antígeno de superfície HBsAg para se replicar. Ela está associada com a presença do vírus B da hepatite (HBV) para causar a infecção e inflamação das células do fígado.
Transmissão: as formas de transmissão são idênticas às da hepatite B, citadas acima.
Sintomas: da mesma forma que nas outras hepatites, quem tem hepatite D pode não apresentar sinais ou sintomas da doença. Quando presentes, os mais comuns são: cansaço, tontura, enjoo e/ou vômito, febre, dor abdominal, pele e olhos amarelados, urina escura e fezes claras.
Prevenção: a imunização para hepatite B é a principal forma de prevenção da hepatite Delta, sendo universal no Brasil desde 2016 (CGPNI/DEVIT/SVS/MS, 2015). Outras medidas envolvem o uso de preservativo em todas as relações sexuais e o não compartilhamento de objetos de uso pessoal – como lâminas de barbear e depilar, escovas de dente, material de manicure e pedicure, equipamentos para uso de drogas, realização de tatuagem e colocação de piercings.
Hepatite E
Causa: o vírus da hepatite E (HEV) pertence ao gênero Hepevirus, família Hepeviridae.
Transmissão: o vírus da hepatite E é transmitido principalmente pela via fecal-oral e pelo consumo de água contaminada, em locais com infraestrutura sanitária deficiente. Outras formas de transmissão incluem: ingestão de carne mal cozida ou produtos derivados de animais infectados (por exemplo, fígado de porco); transfusão de produtos sanguíneos infectados; e transmissão vertical de uma mulher grávida para seu bebê.
Sintomas: os sinais e sintomas, quando presentes, incluem inicialmente fadiga, mal-estar, febre e dores musculares. Esses sintomas iniciais podem ser seguidos de enjoo, vômito, dor abdominal, constipação ou diarreia, presença de urina escura e pele e os olhos amarelados (icterícia).
Prevenção: como ainda não existe vacina para esse vírus, melhorar condições de higiene e saneamento são as principais medidas.
Os cuidados com as hepatites durante a pandemia
A Veja SAÚDE abordou que as hepatites virais estão entre as doenças afetadas pelo coronavírus. Com os sistemas de saúde sobrecarregados, a atenção dada a elas diminuiu. Em entrevista com o médico Paulo Abrão, da Sociedade Brasileira de Infectologia, eles discutem como evitar ou tratar adequadamente a hepatite nos tempos atuais. Confira!