“Niketche – Uma História de Poligamia”: resumo da obra de Paulina Chiziane
A obra é leitura obrigatória da Unicamp 2024 e discute temas contemporâneos como empoderamento feminino e a reflexão sobre tradições
Prestar Unicamp não é moleza! Além de estudar todas as disciplinas, das exatas às humanas, os estudantes também precisam dar conta da leitura de nove obras obrigatórias. Entre elas, está “Niketche – Uma História de Poligamia“, da escritora moçambicana Paulina Chiziane.
É essencial que os candidatos façam a leitura completa do livro, e, paralelamente, estudem seu contexto geral e histórico. Só assim serão capazes de analisar o livro da forma como a prova costuma pedir.
Para ajudar nesta tarefa, o GUIA O ESTUDANTE conversou com Fernando Marcílio, professor de literatura do curso pré-vestibular Anglo, e elencou as principais características de “Niketche – Uma História de Poligamia”. Confira!
Contexto histórico do livro
O livro “Niketche – Uma História de Poligamia” foi lançado em 2002, exatos dez anos após o fim da guerra civil que assolou Moçambique. O conflito foi motivado pelas disputas políticas que sucederam a conquista da independência do país, até então colônia de Portugal. A guerra durou 17 anos, terminando apenas em 1992.
“É uma obra ainda marcada pelos efeitos dessas sucessivas tragédias nacionais. Por isso, coloca-se como representante da literatura africana contemporânea, que se caracteriza pela temática da luta pela liberdade e pelo resgate de raízes culturais.”, explica o professor Marcílio.
Resumo de Niketche
Rami, narradora do livro, conta em “Niketche” sobre a descoberta de que seu marido, Tony, tem outras esposas espalhadas por toda Moçambique. Ao decorrer da história, ela narra os encontros e relacionamentos com estas outras mulheres. A poligamia era um costume em Moçambique, e a narradora mostra os efeitos dessa tradição em uma sociedade que estava se modernizando.
Aos poucos, Rami assume uma posição de liderança das esposas de Tony e, unidas, elas conseguem independência financeira e se sentem estimuladas a buscar relacionamentos amorosos que contemplem suas necessidades afetivas, libertando-se do domínio do marido.
Com um narrador-personagem, o tempo da ação não é especificado, mas, do início ao fim, decorrem alguns meses, durante os quais ocorre a organização das esposas de Tony e a consolidação de seus negócios.
Principais características da obra
Em “Niketche”, surgem diversos diversos temas relevantes às discussões contemporâneas que podem ser pertinentes dentro e fora dos vestibulares. São eles:
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Reflexão em torno da condição feminina: Rami é uma voz que fala em nome de uma coletividade. Ela expressa anseios, desejos, angústias e esperanças de todas aqueles que enfrentam o machismo e o patriarcado de uma sociedade conservadora, que reserva à mulher um papel de submissão;
- Empoderamento feminino: a união das esposas, tema central do livro, é apresentada como forma de resgate da dignidade pessoal e também como instrumento de afirmação da capacidade de participação na vida social em termos de igualdade com os homens;
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Construção de uma identidade pessoal: ao longo da narrativa, Rami vai aos pucos buscando rever seus conceitos (muitos dos quais ligados à tradição que coloca em discussão) e encontra para si uma nova identidade. Nesse sentido, ganham importância os constantes diálogos que ela mantém com o espelho, símbolo da tentativa de superação de uma imagem social consolidada da mulher que se limite a ser um apêndice do marido;
- Tradição repensada: o costume local da poligamia é colocado em discussão. Rami tem consciência de que enfrenta um hábito enraizado no povo moçambicano e busca apresentar seus efeitos para a autoestima feminina.
“Niketche” e outras obras da Unicamp
A literatura lusófona, isto é, aquela produzida em países que têm a Língua Portuguesa como seu idioma oficial, vem ganhando projeção e importância nos últimos anos. Os vestibulares são reflexo disso, com a inclusão de obras como “Mayombe“, de Pepetela (Angola), “Terra sonâmbula“, de Mia Couto e “Nós matamos o Cão Tinhoso!“, de Luís Bernardo Honwana (ambos de Moçambique).
A inclusão de “Niketche” nesse conjunto ainda traz a contribuição fundamental de apresentar a perspectiva feminina no cenário de luta pela libertação que ocorria no país, tanto política quanto social e de gênero. Nesse sentido, vemos uma convergência entre o livro moçambicano e a obra da escritora brasileira Conceição Evaristo, “Olhos d’Água” que também faz parte da lista da Unicamp 2024. Ambos retratam a sociedade e costumes através da perspectiva feminina, além das condições enfrentadas pela comunidade africana e afro-brasileira.
Sobre a autora: quem é Paulina Chiziane
Paulina Chiziane nasceu em Moçambique, no ano de 1955, mais precisamente nos arredores da capital Maputo. Foi a primeira mulher moçambicana a publicar um romance. “Niketche” é uma das maiores representações da escrita de Chiziane, que, com muito humor carregado de delicadeza, expressa as ideias, pensamentos e “papéis” da mulher na sociedade africana.
Paulina foi ativa na luta política contra a dominação e exploração portuguesa pela então colônia de Moçambique, sendo membro da FRELIMO (Frente de Libertação de Moçambique), junto com Luis Bernardo Honwana, autor de “Nós Matamos o Cão Tinhoso!”, obra que compõe a lista de livros obrigatórios da Fuvest.
Alguns recursos linguísticos presentes na narrativa, e que são traços da escrita de Paulina, são as metáforas e as alegorias, que, por vezes, aludem ao universo mítico da cultura moçambicana.
Assim como Hownana, Chiziane foi agraciada em 2003 com o prêmio José Craveirinha de Literatura (mais importante prêmio literário de Moçambique), e, em 2021, com o Prêmio Camões (maior honraria literária dada por Brasil e Portugal).
Em 2016, Paulina anunciou sua aposentadoria da escrita literária, alegando cansaço das lutas travadas ao longo de toda sua vida.
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