Na última segunda-feira (12), os testes, já na fase 3, da vacina da Johnson & Johnson contra a covid-19 foram interrompidos após um dos voluntários do estudo apresentar uma doença ainda sem explicação. Assim como a identidade do paciente, os detalhes do ocorrido não foram informados em respeito à privacidade do participante. Segundo a empresa farmacêutica, um comitê independente de profissionais que monitoram dados e segurança analisará o caso.
Em setembro, a vacina da Universidade de Oxford, em parceria com o laboratório AstraZeneca, uma das opções mais aguardadas para ajudar o mundo contra a pandemia, também teve o teste suspenso, após um dos voluntários apresentar efeito adverso ao tratamento. O paciente desenvolveu mielite transversa, uma síndrome inflamatória. Após quatro dias de suspensão, os responsáveis afirmaram que foi realizado um proceso de revisão e tudo estava certo, então, os teste foram retomados.
A decisão dos responsáveis de pausar a vacinação para que um comitê independente revisasse os dados de segurança foi elogiada pela Organização Mundial da Saúde. “Só porque falamos da rapidez não significa que iremos comprometer ou pegar atalhos nos caminhos a seguir. O processo precisa caminhar de acordo com as regras do jogo. Em termos de remédios e vacinas distribuídos para a população, devemos testar sua segurança em primeiro lugar e acima de tudo”, afirmou Soumya Swaminathan, cientista-chefe da OMS, em entrevista à agência de notícias Reuters.
Quais são as fases necessárias para a produção de uma vacina?
Assim como a vacina de Oxford, o imunizante da Johnson e Johnson, antes da pausa dos teste, já estava na fase 3, última fase dos testes clínicos. O que isso significa? O que acontece depois? Como chegamos até essa etapa? Para responder a essas perguntas, o professor de Biologia do Anglo Vestibulares Marcelo Perrenoud elencou as fases necessárias para que uma vacina seja feita.
Fase pré-clínica: esta primeira fase envolve diversos experimentos laboratoriais, em células cultivadas in vitro e também testes em animais. Aproximadamente 90% dos compostos são reprovados nesta fase, não seguindo adiante.
Fase 1: a subtância é testada em humanos. Pequenos grupos de 20 a 100 indivíduos são analisados, e verifica-se neste momento a dosagem e os efeitos colaterais. Cerca de 70% dos compostos aprovados na fase pré-clínica são reprovados na fase 1.
Fase 2: os testes agora são realizados em grupos de 100 a 300 pessoas. O objetivo agora é verificar a eficácia da futura vacina e os seus possíveis efeitos colaterais.
Fase 3: é a última fase dos testes clínicos, nos quais a vacina é testada em grupos de 300 a 3 mil pessoas. De cada 10 compostos que chegam até esta fase, 7 são reprovados.
Fase 4: com a vacina já em comercialização, ocorre um acompanhamento de grupos de pessoas que receberam doses do composto. Este procedimento visa a verificar se a vacina está atingindo sua eficácia desejada.
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Em live nas redes sociais do GUIA, o professor de Biologia do Sistema de Ensino pH Cícero Melo explicou como funciona a produção de vacinas, e como o corpo reage a elas. Ele também abordou como as etapas de teste citadas acima têm sido realizadas num tempo reduzido, para enfrentar a pandemia o mais rápido possível.
Vacinas em teste no Brasil e no mundo
Em seu relatório mais recente, a OMS informou que há 180 vacinas em desenvolvimento para combater o coronavírus: 35 estão em fase clínica (a partir da fase 1 a 3) e 145 em pré-clínica.
Como explica a reportagem do Estadão, quatro das 29 que iniciaram a fase clínica estão sendo testadas aqui: da Universidade de Oxford em parceria com a AstraZeneca e a Fiocruz (inglesa); a da chinesa Sinovac em parceria com o Instituto Butantã, a da BioNTech/Pfizer (alemã/americana) e, mais recentemente, a desenvolvida pela Janssen Pharmaceuticals (belga/americana), do grupo Johnson & Johnson.
Conheça a história da primeira voluntária brasileira a receber a vacina de Oxford contra a covid-19:
Correndo contra o tempo
É claro que, num contexto atípico como a pandemia que estamos enfrentando, as etapas da ciência precisam ser aceleradas. Mas especialistas alertam que é preciso ter cuidado com as pressões, que envolvem questões políticas e econômicas, já que podem comprometer a qualidade das descobertas.
“Não podemos correr o risco de que essas interferências nos levem a um produto perigoso ou pouco eficaz, que comprometa a credibilidade das vacinas como um todo”, afirmou Flávio Guimarães, pesquisador do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) à revista Veja Saúde.
Esse argumento está muito presente na discussão sobre a liberação precoce do primeiro lote da sua vacina russa contra o coronavírus, a Sputnik, anunciada em 8 de setembro. Como explica a reportagem da Veja Saúde, a liberação foi motivada por resultados positivos de estudos clínicos de fases 1 e 2, mas não é o suficiente: a fase 3 precisa ser realizada para acontecer a comercialização do medicamento. Matéria da BBC Brasil também aponta a importância da fase 3 dos testes clínicos para o sucesso e a segurança da vacina.
Diante de muitos estudos, pesquisas e testes, torcemos para que a ciência vença, com equilíbrio, cuidado e agilidade, a corrida contra o coronavírus – e contra o relógio.