“A Constituição pretende ser a voz, a letra, a vontade política da sociedade rumo à mudança. Que a promulgação seja nosso grito: Muda para vencer! Muda, Brasil!” Foi com essa frase e a edição impressa da nova Carta em mãos que o então deputado federal Ulysses Guimarães (PMDB) encerrou o seu discurso durante a promulgação da Constituição Federal do Brasil, na tarde do dia 5 de outubro de 1988. Sua declaração revela o contexto no qual ela nasceu, no período da redemocratização do país, após a Ditadura Militar (1964-1985).
Baseada em princípios liberais e democráticos e de inspiração progressista, ela teve como meta defender os direitos dos cidadãos brasileiros, ampliar as liberdades civis e garantir os deveres do Estado. É a sétima Constituição desde a Independência, em 1822, e a sexta do período republicano.
Também conhecida como Constituição Cidadã, foi elaborada pela Assembleia Nacional Constituinte, composta por 559 congressistas eleitos democraticamente em 1986, e presidida por Ulysses Guimarães. A preparação do texto durou cerca de um ano e meio e foi feita coletivamente, com a participação da sociedade civil, por meio de abaixo-assinados. Entre os constituintes estavam figuras que se tornariam presidentes, como Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Michel Temer.
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Consolidação de direitos
Com o fim do regime militar e o início do processo de redemocratização, havia uma demanda muito forte da sociedade pela manutenção e fortalecimento da democracia e pela ampliação dos direitos individuais e coletivos. Os constituintes buscaram contemplar essas questões, o que resultou em um texto extremamente detalhado para que essas garantias fossem reconhecidas e consolidadas. Confira algumas características da Constituição:
- Na nova Carta, houve um grande avanço nos direitos relacionados à educação e à seguridade social, assim como na área da saúde, com a implantação do SUS (Sistema Único de Saúde).
- O texto também definiu uma série de leis que proíbem a tortura, trabalhos análogos à escravidão e combatem o racismo, classificando-o como crime inafiançável e imprescritível.
- Defendeu direitos trabalhistas, como o décimo terceiro salário, o seguro-desemprego e a redução da jornada de trabalho (de 48 para 44 horas).
- Estabeleceu o direito à greve, à liberdade de expressão e de organização sindical e o fim da censura dos meios de comunicação.
- Também apresentou medidas de proteção ao meio ambiente e a demarcação de terras indígenas.
- Consagrou o código de defesa do consumidor e os direitos de crianças e adolescentes.
- Possibilitou o voto aos analfabetos, o fortalecimento do poder Legislativo e a autonomia do Judiciário para julgar e anular atos do Executivo e do Legislativo.
- Na economia, promoveu o monopólio do Estado nos setores estratégicos (como gás, petróleo, eletricidade e telecomunicações), tabelou os juros em 12% ao ano e aplicou diversas restrições que foram alteradas posteriormente. O salário mínimo tornou-se o piso para os benefícios da seguridade social.
- O federalismo e a tripartição de poderes foram mantidos.
- A Carta continha uma emenda sobre um plebiscito que seria realizado em 1993 e determinaria se o governo seria presidencialista ou parlamentarista. O presidencialismo venceu, o que possibilitou voto universal direto, secreto e obrigatório para maiores de 18 anos e facultativo para aqueles com mais de 16 anos. Isso alterou o perfil do eleitorado brasileiro e gerou uma grande inclusão eleitoral.
Emendas e legado
Se, por um lado, a Constituição de 1988 trouxe uma série de avanços em termos de garantia de direitos quando comparada com os textos anteriores, por eles terem sido explicitados e detalhados, por outro lado ela também não garantiu ao Estado meios para cumpri-las.
O seu texto extenso e excessivamente minucioso faz com que mudanças pontuais, previstas na lei, dependam de emendas e, portanto, de aprovação por maioria absoluta (3/5) das duas casas (Câmara dos Deputados e Senado) do Congresso Nacional. Isso agravaria a negociação entre os Poderes Executivo e Legislativo, contribuindo para tornar o processo político um jogo permanente de troca de favores vulnerável a interesses particulares. É o chamado presidencialismo de coalizão.
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Essa visão, no entanto, é contestada por aqueles que afirmam que essa relação de “toma lá, dá cá” pode estar presente em qualquer negociação política e que muitas das tentativas de mudar a Constituição teriam a intenção de eliminar os direitos que foram garantidos na Carta. Ainda que se tenham diferentes olhares sobre a Constituição de 1988, vale lembrar que ela foi fundamental para assegurar a cidadania e consolidar a democracia no Brasil.
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