As consequências da chegada da Corte Portuguesa ao Brasil, em 1808, que favoreceu diversas transformações culturais e pouco tempo depois resultou na Independência do país, em 7 de setembro de 1822, e o retorno de D. Pedro I a Portugal, em 1831, serão tema da série “Brasil Imperial”. Os dez episódios, uma produção original da Fundação Cesgranrio, estreiam nesta terça (10) no Amazon Prime Video.
A trama é narrada por Joaquim Gonçalves Ledo (1781-1847), jornalista e político que foi uma das lideranças da luta pela independência e pela democratização da sociedade brasileira. Durante a temporada, o público vai conferir diversas histórias de conspirações políticas, negociações e batalhas da época.
Uma delas é conhecida como a Noite das Garrafadas. O conflito ocorreu nas ruas do Rio de Janeiro, em 13 de março de 1831, e ganhou esse nome porque brasileiros insatisfeitos com o reinado de D. Pedro I utilizaram pedras e garrafas para atacar portugueses que o apoiavam. Menos de um mês depois, sem apoio político ou militar devido às sucessivas crises políticas no governo, o Imperador renuncia ao trono em nome do filho D. Pedro de Alcântara, de cinco anos de idade, e retorna a Portugal.
Na trama, também é possível acompanhar o casamento conturbado de Dom Pedro I com a princesa austríaca Leopoldina. Ela sofria com as inúmeras traições do marido, que buscava novas amantes quase todas as noites. A mais conhecida delas era Domitila de Castro, nomeada Marquesa de Santos pelo monarca.
Leopoldina era conhecida na Corte pela inteligência e astúcia. Chegou com 20 anos de idade ao Brasil, em 1817, para conhecer o marido, com quem já havia se casado por procuração na Áustria. Um detalhe curioso é que eles nunca haviam se visto anteriormente, apenas trocado cartas. Na aristocracia da época, o casamento funcionava numa espécie de acordo de interesses para manter o poder das famílias reais europeias.
A série dá espaço a personagens femininas que acabam deixadas de lado pelos registros históricos oficiais. “Temos toda representatividade de mulheres fortes. Vamos falar de Carlota Joaquina, Leopoldina, Domitila, entre outras. Vale a pena assistir para conferir a personalidade de cada uma delas”, disse o diretor Alexandre Machafer.
Para trazer a atmosfera do século 19, toda a trama foi gravada em locações reais do Rio de Janeiro. “Na história de Domitila, por exemplo, filmamos na casa que foi dela. A atriz vivenciou onde a personagem morou de verdade”, afirma Machafer.
Além disso, questões importantes relacionadas à escravidão estão presentes na série. Vale lembrar que o Brasil foi o país que mais recebeu escravos entre 1501 a 1900. De acordo com o Banco de Dados do Comércio Transatlântico de Escravos, desenvolvido por diversas instituições internacionais, como a Universidade Harvard e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), 4,86 milhões desembarcaram em território brasileiro.
Um romance ficcional inesperado para o período entre o português Arrebita e a ex-escrava Ana do Congo guiará a narrativa da primeira temporada. “Acompanharemos toda a dificuldade para manter esse amor vivo diante do preconceito”, afirma Machafer.
Mas por que a Família Real veio ao Brasil?
A chegada da Família Real portuguesa ao Brasil, em 22 de janeiro de 1808, na cidade de Salvador, e posteriormente no Rio de Janeiro, é uma consequência direta da Era Napoleônica (1799 a 1815). Esse período se iniciou com o Golpe do 18 de Brumário e terminou com a derrota de Napoleão Bonaparte na batalha de Waterloo. O general francês chegou ao poder com apoio da burguesia e do exército para dar continuidade aos ideais da Revolução Francesa, que colocou em xeque a existência das monarquias absolutistas europeias.
Desde a derrota dos portugueses na Guerra das Laranjas, em 1801, as relações de Portugal e França eram delicadas. Napoleão fazia pressões constantes para os lusitanos cortarem relações diplomáticas com os ingleses. Em 1804, ele havia se autonomeado imperador e tinha planos de dominar todos os países do continente. Mas encontrou um grande obstáculo no caminho: a Inglaterra. O conflito estabelecido entre França e Inglaterra foi a principal causa da fuga da Corte portuguesa. A partir de 1806 essa disputa se acirrou. Como os franceses não conseguiam derrotar os ingleses e, por consequência, invadir seu território fortemente protegido pela marinha, Napoleão decidiu impor o Bloqueio Continental.
Ou seja, nenhum país da Europa continental poderia fazer comércio com a Inglaterra, sob a pena de ser invadido pela França. “Napoleão literalmente mandou um comunicado a todas as monarquias, que foram obrigadas a concordar”, afirma o professor Alfredo Terra Neto, coordenador do Curso Pré-Vestibular Oficina do Estudante.
Porém, em Portugal a situação foi um pouco diferente. Como D. João, regente do país, não queria entrar em guerra com o exército francês e muito menos abrir mão da aliança com a Inglaterra, decidiu adotar a chamada diplomacia pendular. “Os portugueses falavam para Napoleão que iriam aderir ao bloqueio. Mas, ao mesmo tempo, diziam aos ingleses que isso jamais aconteceria”, afirma Neto.
Cansado de esperar, Napoleão Bonaparte deu um ultimato para que os portugueses cumprissem uma série de imposições: convocar o embaixador que estava em Londres; expulsar o embaixador inglês de Lisboa; fechar os portos para navios ingleses; e declarar guerra à Inglaterra. Mas D. João se recusou a aceitar os termos, então o imperador francês enviou tropas para invadir Portugal e pôr fim ao domingo da Casa Bragança.
Essa decisão determinou a transferência urgente da Corte portuguesa para o Brasil. De acordo com o livro 1808, escrito por Laurentino Gomes, os preparativos foram feitos às pressas. De 10 a 15 mil membros da nobreza embarcaram em navios para fugir das tropas francesas entre os dias 25 e 27 de novembro de 1807.
“Depois disso, o Brasil passa a ser sede do Império Português. Aqui são criados diversos órgãos administrativos que permitem ao rei e à Corte controlar suas colônias espalhadas pelo mundo. Aos poucos foram produzidas diversas estruturas fundamentais que ajudaram na Independência e, inclusive, contribuíram com a nossa unidade territorial”, explica Neto.
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