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Enem 2020: confira redações sobre estigma social das doenças mentais

Professores mostram três maneiras de desenvolver o tema exigido pela banca do Exame Nacional do Ensino Médio

Por Redação do Guia do Estudante
Atualizado em 20 jan 2021, 19h07 - Publicado em 18 jan 2021, 06h14
Caderno pautado e caneta preta
 (Mira Cosic/Unsplash/Reprodução)
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Num ano marcado pelo isolamento social, o Inep propôs aos estudantes refletirem sobre o estigma social das doenças mentais na sociedade brasileira. Segundo os professores ouvidos pelo GUIA, não foi um tema inesperado no contexto da pandemia de coronavírus e os estudantes que se prepararam tiveram chances de desenvolvê-lo com tranquilidade.

Mas, se você ficou em dúvida sobre como poderia ser a redação do Enem 2020, apresentamos a você três modelos. O primeiro feito pelos professores de redação da Plataforma AZ David Gonçalves e Marina Rocha; o segundo da banca da disciplina da Oficina do Estudante e o terceiro por Rodrigo Noronha, professor de redação do sistema COC by Pearson.

Os três textos reúnem todas competências exigidas pela banca e podem ajudar os estudantes a ter uma ideia do que esperar da nota.

O legado

No século XX, a médica psiquiatra Nise da Silveira alterou o paradigma dos tratamentos de pacientes com transtornos mentais no Brasil como resultado da substituição de métodos desumanos e violentos, como eletrochoques e camisas de força, por arte e inclusão social. Contudo, infelizmente, apesar dos esforços de Nise, a marginalização de indivíduos com doenças mentais ainda é uma triste realidade no país. Isso ocorre pois tais pessoas sofrem com estigmas relacionados à falta de reconhecimento de suas patologias e à percepção de que são incapazes.

Boa parte da sociedade não reconhece as doenças mentais a partir de um olhar realmente sério. Apesar de, nos últimos anos, pautas como ansiedade e TOC ganharem mais relevo, muitos veem essa discussão como desimportante por acreditarem, equivocadamente, que as pessoas afetadas estão exagerando ou, ainda, criando formas de ganharem atenção. Essa perspectiva trata de modo superficial o conceito de doença, pois entende que patologias são resultados apenas da ação de vírus e bactérias. Tal ignorância faz com que indivíduos com esses transtornos fiquem desamparados principalmente no que diz respeito aos tratamentos médicos adequados.

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Além disso, é inegável que os que sofrem com doenças mentais são delegados a um espaço de inutilidade. O hospital psiquiátrico Colônia de Barbacena ficou conhecido como um lugar em que pacientes com variados transtornos eram internados sem qualquer distinção médica ou diagnóstico mais específico. Nessa instituição, em um momento histórico no qual as doenças mentais eram vistas como incapacitantes, milhares de pessoas morreram entre as décadas de 60 e 70. Apesar de certos avanços atuais, como Centros de Atenção Psicossocial, essa noção não se apagou no tempo. Muitos ainda consideram pacientes como inúteis ou incapazes de conviver socialmente, o que os coloca em uma posição de invisibilidade, desprezo e abandono. Nota-se, dessa maneira, que o holocausto brasileiro parece ter deixado marcas profundas a serem superadas.

Verifica-se, assim, a necessidade de combater as perspectivas reducionistas em relação às patologias mentais. Dessa maneira, a mídia deve fomentar o debate sobre a seriedade e a diversidade dessas doenças. Isso pode ocorrer com séries, filmes, programas de auditório e reportagens, que contem com a participação de especialistas na área. Será possível, com isso, elevar a discussão ao nível de saúde pública. Ademais, o Estado deve aumentar o número de Centros de Atenção Psicossocial, a fim de oferecer aos pacientes possibilidades de tratamento que os retirem da condição imposta de inutilidade. Com tais medidas, será possível criar um legado necessário aos ensinamentos de Nise da Silveira.

David Gonçalves e Marina Rocha, Plataforma AZ 

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Das redes à vida real

Relatos sobre doenças mentais têm se tornado cada vez mais comuns nas redes sociais. Em 2020, noticiado em diversos portais, como o R7, o caso de Raíssa Barbosa, ex-participante do reality show “A Fazenda”, tomou o topo dos trending topics do Twitter durante semanas: a participante, que possui Síndrome de Borderline, foi abusada mentalmente durante sua estadia no programa, o que gerou inúmeros debates sobre o assunto. Nesse sentido, o caso de Raíssa é exemplar do momento atual, pois ainda que o assunto esteja começando a ganhar mais espaço no debate público, a violência sofrida pela participante mostra que ainda persiste um estigma sobre as doenças mentais que deve ser combatido.

É importante ressaltar o aspecto positivo do crescente debate sobre doenças mentais. No atual contexto da pandemia do coronavírus, por exemplo, observa-se nas redes sociais e na televisão diversos conteúdos com dicas sobre como manter a saúde mental (e também física) na situação de isolamento social. O apoio massivo que Raíssa Barbosa recebeu no Twitter por meio da #RespeiteRaissa, endossado virtualmente por famosos e profissionais de saúde, aponta para o fato de que o estigma sobre as doenças mentais vem sendo combatido pela população, movimento que é de extrema urgência em um país como o Brasil, no qual, somente de depressão, sofrem cerca de 11,5 milhões de pessoas. Nesse contexto, mais pessoas são encorajadas a contar suas histórias, a reconhecer seus sofrimentos e, assim, a solicitar ajuda médica.

No entanto, tais debates não podem estar restritos à mídia ou às redes sociais. Como observado em A Fazenda, situações como a de Raíssa, que foi comprovadamente provocada a ter crises para ser expulsa do programa, mostram como ainda há um comportamento preconceituoso e danoso por parte da população. Apesar de as redes sociais cumprirem o importante papel de dar visibilidade à questão, elas não necessariamente oferecem um conteúdo confiável e especializado sobre o tema, o que favorece a desinformação. Por esse motivo, é preocupante a falta de medidas governamentais, que integrem profissionais da saúde e da educação, na produção coordenada de conteúdo confiável para o combate a esse estigma.

É urgente, portanto, que o Ministério da Saúde, junto aos estados e municípios, crie, com o auxílio de profissionais da saúde e da educação, uma campanha sobre as doenças mentais que existem no Brasil, com o intuito de instruir a população sobre essas doenças e sobre como e em quais circunstâncias é necessário solicitar ajuda médica. Por meio de propagandas divulgadas nas redes sociais e na televisão, o povo terá acesso a informações claras e especializadas, o que poderá combater o preconceito e, ao mesmo tempo, oferecer ajuda à ainda silenciosa população que a necessita. Com essas medidas, situações de abuso como as de Raíssa poderão começar a deixar de existir no país.

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Banca de redação da Oficina do Estudante

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Desde o século XIX, com o “Palácio dos loucos”, primeiro hospício brasileiro, a 2020, ano marcado pela pior pandemia dos últimos anos, os doentes mentais sofrem com os danos da segregação. Na contemporaneidade, nota-se maior mudança no comportamento do indivíduo, seja pela própria pandemia, ou pelo estresse do dia a dia e, em consequência disso, vê-se uma sociedade completamente combalida por ansiedade, medo, angústia e patologias que se vertem sobre a área psíquica em geral. Diante disso, como os indivíduos que são acometidos por esses problemas conseguem conviver harmoniosamente? Quais os estigmas associados às doenças mentais na sociedade brasileira?  

Ressalta-se que essas enfermidades sempre foram associadas à loucura. Nesse esteio, pode-se elencar a própria mídia como fator fundamental de exposição desses indivíduos como seres marginalizados. No cinema, na televisão, ou na literatura é possível ver personagens estereotipados como loucos. Um exemplo recente é o personagem “Coringa”, interpretado por Joaquim Phoenix e que lhe rendeu uma estatueta do Oscar. A premiação da indústria cinematográfica deixou clara a superexposição de caricaturas ligadas à loucura. Além disso, as doenças mentais sempre foram negligenciadas e estiveram ligadas ao alucinado, o que, de certa forma, impõe à sociedade o medo do doente psíquico.

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Ademais, para Gilles Lipovetsky, a supervalorização do “ego” (do “eu sou”, “eu faço”, “eu posso tudo”) é extrema na contemporaneidade, associada ao consumo exacerbado e mudanças intensas e urgentes, tudo em movimento frenético e veloz. Todavia, a pandemia, de súbito, rompeu com o ritmo hipermoderno, enquanto a mente humana sofre os efeitos desse choque significativo entre a cultura do excesso e a imposta necessidade de moderação, de frear a vida individualista, de isolar-se. No entanto, os estigmas associados às doenças mentais reverberam a dificuldade nas oportunidades de emprego, ou até mesmo a reabilitação no convívio social e familiar de quem apresenta transtornos psiquiátricos, substanciando e hiperbolizando cada vez mais a questão segregacionista junto aos doentes mentais.

Por conseguinte, é necessário que os governantes, na esfera municipal, ou estadual, ou federal – na Secretaria de Saúde Pública ou no Ministério da Saúde –, adotem medidas voltadas à área da saúde para reabilitar os doentes mentais e, consequentemente, inseri-los no convívio social. Além disso, é preciso criar instituições preparadas para receber os doentes mentais com ambientes totalmente voltados para esses indivíduos. Um fator muito forte são as campanhas publicitárias veiculadas pela internet, pois esta mídia é bastante eficaz, visto que é de fato um campo interativo de comunicação. Outrossim, é importante esclarecer formas de custeio para atingir o objetivo, tal como um novo imposto e taxas sociais específicas para a questão da saúde mental. Por fim, pode-se também incentivar a participação da iniciativa privada – ONGs.

Rodrigo Noronha, professor de redação do sistema COC by Pearson

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