No dia seguinte ao impeachment da presidente eleita Dilma Rousseff, a população de muitas capitais e cidades brasileiras foram às ruas protestar contra o governo que, de temporário, passou a ser permanente. No último dia 7 de setembro, dia da Independência do Brasil, houve manifestações em todos os 26 estados brasileiros (incluindo o Distrito Federal) em favor da queda do atual presidente Michel Temer.
Além das redes sociais, inundadas com a hashtag #ForaTemer, a semana seguinte ao impeachment de Dilma, as ruas foram tomadas pelas pessoas. Algumas pedem “Diretas Já”, outras chamam Temer de golpista, outras querem eleições gerais. Vamos entender, afinal, o que são essas manifestações pedindo a saída de Temer?
Ato contra Michel Temer em São Paulo. Foto: Paulo Pinto/Fotos Públicas
A força das manifestações de rua
Os protestos de junho de 2013 reacenderam a vontade de muitos brasileiros em sair às ruas para reivindicar seus direitos, e levou às ruas quem nunca havia se manifestado – na sua maioria, jovens. A partir do dia 1º de setembro, quando Michel Temer assumiu definitivamente a Presidência da República até 2018, as ruas foram preenchidas, novamente, com o povo.
Em São Paulo, os “atos” – como são chamadas essas manifestações – aconteceram todos os dias desde que Temer assumiu o governo. No aniversário da independência brasileira, 100 mil pessoas foram às ruas em Salvador. Nas demais capitais, somam-se dezenas de atos durante a semana.
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Quem vai às ruas contra o governo Temer está contra o quê?
Nos protestos, os gritos de “Fora Temer” ou “Temer Golpista” são estridentes. Mas canta-se também: “Temer machista, cadê nossas ministras?” ou “Se empurrar o Temer cai”. Fato é que as razões que levam a população às ruas são muitas e diversas – isso porque não são apenas grupos fechados, de movimentos sociais ou ideologias definidas.
Vão às ruas estudantes, jovens, trabalhadores, professores; pessoas que têm seus motivos para estar ali, mas que não, necessariamente, são os mesmos para todos. O Politize! lista aqui alguns dos principais motivos pelos quais se está saindo às ruas:
– Crer que o impeachment de Dilma é ilegítimo e que foi um golpe. Segundo os manifestantes, esse golpe seria orquestrado pelos parlamentares que não mais queriam Dilma no governo e que, por ela estar sem base aliada e com seu poder e influência enfraquecido, teriam conseguido tirá-la do cargo. Outra razão em que se crê na ilegitimidade do impeachment é que as pedaladas fiscais não seriam motivo suficiente para sua destituição, posto que são práticas comuns a vários governos estaduais e ex-presidentes.
– Ir de encontro aos valores de Temer para seu governo, como:
- a previsão de corte de verbas da educação pública e da saúde;
- a possibilidade levantada de se cobrar pelo ensino superior público – nas universidades federais;
- a reforma nas leis trabalhistas, dando mais “liberdade” de acordos entre empregador e empregado sobre os termos da contratação e do regime de horas;
– As numerosas mudanças que Temer fez enquanto ainda era presidente interino, como mudar todos os ministros e ministras. Extinguiu ministérios relevantes como o da Cultura, da Igualdade Racial, dos Direitos Humanos e o das Mulheres.
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O que reivindicam os manifestantes?
Primeiramente, a queda do governo Temer. É a única pauta unânime de todos os que estão na rua: todos querem que ele caia antes das próximas eleições, em 2018. E outro ponto em que os manifestantes, em grande maioria, estão de acordo é a realização de uma nova eleição. Gritam nas ruas: “O povo é que tem que decidir”. Ou seja, adiantar as eleições de 2018 para 2016.
Algumas pessoas também gritam “Diretas Já”, fazendo referência à transição da ditadura à democracia em 1984, em que o povo foi às ruas pedindo que as eleições não fossem indiretas (realizadas pelo Congresso Nacional), mas sim diretas (voto pelo povo).
Quanto à realização de eleições diretas, não é um cenário impossível de acontecer. Existem quatro ações do Tribunal Superior Eleitoral que pedem a cassação da chapa eleita em 2014 (Dilma e Temer) em tramitação. Contudo, a lei diz que uma nova eleição só acontecerá caso a chapa seja cassada ainda nos dois primeiros anos do mandato presidencial (ou seja, até o fim de 2016). Se a cassação ocorrer depois desse prazo, as novas eleições serão indiretas, feita por deputados e senadores.
Segundo o Jornal Nexo, existem projetos no Congresso que preveem a antecipação da eleição por meio de um plebiscito a fim de consultar a população a respeito da ideia.
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Quem organiza os protestos? E quem vai neles?
Existem grupos e frentes de movimentos sociais que organizam e pensam esses protestos. São organizações que já têm bagagem nesse tipo de ato e, por isso, pensam-nos de maneira estratégica. Porém, a maioria das pessoas que está nos atos não faz parte desses grupos.
Nas manifestações convivem desde black blocs até professores, estudantes, trabalhadores, de todas as idades – desde crianças até idosos. Por isso, além de ser praticamente impossível descrever todas as reivindicações das pessoas, as ações durante o ato também são heterogêneas. Afinal, quem vai aos protestos?
– Os organizadores dos protestos, das frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, de movimentos sociais como MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) e CMP (Central de Movimentos Populares), e da CUT (Central Única dos Trabalhadores). Além de sindicalistas de todas as áreas. São boa parte das pessoas que compõem as manifestações.
– Pessoas comuns, trabalhadores e estudantes, que vão às ruas sem muito know-how de protestos, mas que acreditam na necessidade de protestar contra o governo em exercício. Nos protestos atuais, estão presentes em número expressivo – equiparam-se ao número de pessoas que são de grupos “estabelecidos”, mas não chegam a ser maioria.
– Os black blocs ou pessoas que têm ideologias similares, por exemplo, utilizam da força para chamar a atenção da grande mídia à cobertura dos protestos e de tudo o que acontece neles. Eles acham que ao depredar o patrimônio particular e público, chama-se atenção para as pautas que reivindicam. São compostos por poucas pessoas, normalmente em torno de 20 a 30 em grandes cidades – ou seja, uma parcela minúscula do total de manifestantes.
Portanto, as atitudes dentro dos protestos não são homogêneas, pois o próprio público não é. A questão desses protestos é que, às vezes, alguns grupos agem de acordo com a sua ideologia – que tolera o uso da violência – e isso pode colocar um número maior de pessoas numa encruzilhada com a polícia, que responde às investidas.
A repressão policial durante os protestos
Existem várias cenas de repressão policial publicadas nas redes sociais, às vezes sem o contexto e, por isso, questiona-se a motivação dessas atitudes. Traçar uma regra é impossível, posto que as ordens de ação das Polícias Militares estão restritas ao governo de cada estado, que terá individualmente uma linha a seguir.
São vários os motivos pelos quais a Polícia Militar ataca os manifestantes. Veja situações de ação policial que aconteceram na maioria das cidades:
– Sem violência por parte dos manifestantes, os policiais são ordenados a atacar com bomba de gás lacrimogêneo, spray de pimenta e atirar balas de borracha. Esse é o caso que gera mais comoção e indignação tanto dos presentes como posteriormente, através da divulgação de vídeos que comprovam essas ações.
– Para dispersar os manifestantes e por um fim no protesto, os policiais agem com violência – nesse caso, pode haver tumulto e agitação, mas normalmente os manifestantes não estão agindo com violência.
– A fim de coibir a depredação de patrimônio público ou privado – como pichações, quebra de portas e janelas, ataque a veículos estacionados, a PM, age com violência para deter essas atitudes de alguns dos manifestantes – nesse caso, a probabilidade de serem black blocs é bastante alta, por atacarem o patrimônio e não pessoas.
– A Polícia Militar revida atitudes violentas de manifestantes quando a confusão é entre quem está protestando, com pessoas de fora ou com a própria polícia. Nesse caso, a ideia é evitar a continuidade de ações violentas (usando como meio a própria violência).
De qualquer forma, é direito fundamental da Constituição a manifestação de credo, ideologia, ou qualquer maneira que se encontre de dizer o que se pensa nas vias públicas. O dever fundamental da Polícia é impedir que ações violentas sejam iniciadas e cercar a manifestação enquanto ela acontece – delimitando quais ruas serão fechadas e garantindo a segurança de quem está nas ruas se manifestando.
*Post publicado originalmente no portal Politize!. Reiteramos que os conteúdos produzidos têm caráter educacional e não refletem o pensamento da instituição.