No dia 23 de junho de 2016, os cidadãos do Reino Unido participaram de um plebiscito em que podiam escolher entre duas opções: o Reino Unido permanecer (“remain”) ou deixar (“leave”) a União Europeia. No fim das contas, venceu a opção pela saída dos britânicos da UE, com 52%. Sem dúvida, esta é uma decisão de grandes proporções para aquele país, para a Europa e para todo o mundo. Vamos entender um pouco melhor as implicações do Brexit.
O QUE É BREXIT?
A sigla Brexit é uma junção de “Britain” e “exit”, que em português significa saída do Reino Unido (da União Europeia). O Brexit, opção que venceu o plebiscito, consiste basicamente no desmembramento, por parte do Reino Unido, do bloco da União Europeia.
O QUE É A UNIÃO EUROPEIA?
Surgida após a Segunda Guerra Mundial e desenvolvida ao longo de décadas, a União Europeia é um bloco econômico acordado entre vários países europeus (com a saída do Reino Unido serão 27 países-membros), cujo objetivo maior é promover a integração e a cooperação entre tais países, em diversos aspectos: econômicos, culturais e políticos.
Os irremediáveis prejuízos da Primeira e Segunda Guerras serviram de inspiração para o surgimento da UE. Em lugar da desconfiança e do isolacionismo que as grandes potências europeias mantiveram entre si na primeira metade do século XX (e a rigor ao longo de grande parte de sua história), líderes desses países preferiram adotar medidas que aproximassem as populações do continente, promovendo a cooperação e um sentimento de unidade europeia. Os líderes europeus acreditavam, após a Segunda Guerra Mundial, que essa integração conduziria a região a uma paz definitiva.
De alguma forma, eles estavam certos, afinal a União Europeia existe até hoje, mais de sete décadas após o fim da Segunda Guerra, e já alcançou acordos de integração em um nível inédito na história mundial: abertura comercial, formação de um mercado comum europeu, acordo de livre circulação de pessoas e até a unificação monetária (o Euro é a moeda oficial de 19 países europeus atualmente).
A União Europeia tornou-se uma forte organização política, com significativo poder de decisão na vida dos europeus. Possui um parlamento e também uma corte de justiça. Tudo isso são feitos que não encontram paralelo na história mundial: vários Estados soberanos optaram por se integrar e até mesmo abrir mão de parte de suas soberanias, por entender que a cooperação entre si traria mais benefícios para si.
POR QUE O REINO UNIDO ESCOLHEU DEIXAR A UNIÃO EUROPEIA?
A realização e o resultado do plebiscito sobre a presença do Reino Unido na União Europeia traduzem um sentimento compartilhado por muitos europeus em relação à essa organização – especialmente nos últimos anos. Como você já deve saber, o mundo passa por uma grave crise de refugiados: chegamos ao maior número de pessoas que abandonam seu país-natal desde a Segunda Guerra Mundial, por causa de conflitos armados que ameaçam suas vidas. Desesperadas, essas pessoas fogem para lugares que eles acreditam serem seguros e acolhedores.
Por esse motivo, milhões de pessoas têm migrado incessantemente de países da África e do Oriente Médio para a Europa. A onda de imigrantes assusta muitos europeus, que muitas vezes reagem com xenofobia em relação a essas pessoas.
A campanha pelo Brexit certamente foi muito fortalecida pela percepção de que o Reino Unido estava sendo prejudicado pela facilidade com que muitos estrangeiros conseguiam migrar para o país. A alegação de que o país não possui controle efetivo sobre suas próprias fronteiras por causa da União Europeia pesou bastante para o resultado final.
Além da questão da imigração, também há o argumento de que a União Europeia cria uma situação injusta entre seus membros, em que os países com economias mais fortes (como Alemanha, França e Reino Unido) sustentam os países economicamente mais fracos e endividados (Espanha, Portugal, Grécia, Itália, etc).
Por fim, é preciso notar que o Reino Unido é um país que guarda algumas diferenças com seus vizinhos. O país fica em uma ilha e sua vocação marítima o alçou à condição de maior império do mundo no século XIX, com colônias espalhadas por todo o globo. É daí que vem a famosa frase “O sol nunca se põe no império britânico”.
O sentimento nacionalista britânico, portanto, pode ter sido um apelo para que a população da ilha (principalmente os ingleses e galeses) deixasse seus pares europeus. Membro da UE desde 1973, o Reino Unido sempre teve uma participação titubeante no bloco. Um exemplo disso é que o país nunca adotou o euro como moeda (a libra esterlina continuou circulando). O país também não participou completamente do acordo de Schengen, que não era originalmente parte da União Europeia, mas desde 1997 faz parte do quadro jurídico; tal acordo criou um espaço de livre circulação de pessoas entre países europeus, sem a necessidade de controle de passaporte.
AGORA QUE O BREXIT VENCEU, O QUE ACONTECE?
Com a vitória da saída do Reino Unido da União Europeia, abre-se um período de incertezas, afinal, essa é a primeira vez que um membro decide deixar a união. O primeiro-ministro britânico, David Cameron, que fez campanha pela permanência de seu país, já declarou que renunciará ao seu cargo em outubro, afirmando que um novo primeiro-ministro deve conduzir as negociações de saída do bloco. Agora, Reino Unido e União Europeia terão de fazer intensas negociações, que definirão como será a relação entre eles de agora em diante.
Veja no infográfico abaixo como funciona, de acordo com o artigo 50 do Tratado de Lisboa, o processo de saída de um membro da União Europeia:
Além disso, há previsões preliminares sobre como a saída afeta na prática o dia a dia dos britânicos, dos europeus e do resto do mundo:
Economia
As previsões sobre as consequências do Brexit para a economia não são positivas. O país deve sofrer perdas por não participar mais do mercado comum europeu – a União Europeia já sinalizou de que não manterá intacto o acesso a esse mercado se não o Reino Unido não aceitar também a livre circulação de pessoas. Não se sabe ao certo em que nível a economia britânica e mundial será afetada, mas é os resultados no curto prazo já são negativos. Nos próximos anos, o país pode experimentar desvalorização de sua moeda, aumento da inflação, recessão econômica, queda na renda per capita, entre outros problemas graves.
Além disso, o Reino Unido também não participará mais das negociações da criação de uma área de livre comércio entre a União Europeia e os Estados Unidos, que se for concretizada será a maior área de livre comércio já registrada na história.
Imigração
Apesar de ainda não serem conhecidas as consequências exatas em relação à imigração, é provável que haja maior controle na entrada de estrangeiros no país. Como membro da União Europeia, o Reino Unido teve de receber uma parcela dos refugiados que chegaram ao continente, o que parece ter sido um dos grandes motivos para o Brexit. Agora, sem fazer parte do bloco, o país terá mais liberdade para regular a entrada de imigrantes.
Texto originalmente publicado no site Politize!