10 passos para entender o “toma lá, dá cá” na política brasileira
A poucas semanas da votação do impeachment da presidente Dilma Rousseff na Câmara dos Deputados, o PMDB decidiu encerrar a aliança com o governo do PT no dia 30 de março.
O PMDB era o maior partido da base aliada do governo. Além de ter controlado cerca de 600 cargos na administração federal e sete ministérios durante a parceria, a sigla ainda possui a maior bancada no Congresso, com 69 deputados e 18 senadores, e pode ser o fiel da balança para definir a permanência ou a saída de Dilma. O PMDB também é o partido do vice-presidente Michel Temer – é ele quem assume no caso de Dilma perder o cargo em um processo de impeachment.
Desde o final da ditadura militar em 1985, o PMDB desempenha papel central na política brasileira, ocupando cargos de primeiro escalão em todos os governos federais após a redemocratização, independentemente da posição ideológica do partido que está no poder.
Um dos fatores que explica esta relação do PMDB e de outros partidos com o Poder Executivo é o chamado fisiologismo.
Entenda como esta prática do “toma lá, dá cá” funciona e por que o problema vem se perpetuando no atual sistema político brasileiro:
1. No jogo institucional entre o Poder Executivo e o Congresso Nacional, fala-se de alianças e composições entre o partido do governo e outras siglas para formar uma base aliada.
2. No caso do governo federal, essa prática é chamada de presidencialismo de coalizão – o governo busca manter uma maioria parlamentar no Congresso Nacional para conseguir aprovar os seus projetos.
3. O que justificaria estes acordos seria a governabilidade, ou seja, o presidente busca condições estáveis na relação com o Poder Legislativo, de forma a governar sem sobressaltos. Isso foi o que fizeram todos os governos desde o regime militar, encerrado em 1985.
4. Nesses casos, os partidos que compõem a base aliada exigem algo em troca do apoio ao governo. Esse “algo”, nas negociações políticas, costuma ser cargos estratégicos na máquina pública – de diretorias de estatais, como a Petrobras, a ministérios. É o chamado loteamento dos cargos públicos.
5. Trata-se de um mecanismo que deveria ser normal. Afinal, se partidos se aliam para disputar eleições, supostamente compartilham ideias e projetos em comum, que são sistematizados em um programa de governo. Portanto, nada mais natural do que dividir a responsabilidade por coordenar a ação governamental.
6. Na prática, porém, as alianças políticas se formam sem uma base clara de programa. São muitas as eleições nas quais inimigos se unem por conveniência, em acordos visivelmente sem princípios. É o chamado fisiologismo, usado por governos com o intuito de obter maioria no Legislativo e poder aprovar as leis de que necessitam para governar. Em outras palavras, o Executivo faz uma barganha: oferece cargos na administração pública a partidos e em troca recebe apoio para as propostas do governo.
7. O fisiologismo substitui o debate de projetos, que deveria nortear a atuação do Parlamento e sua relação com o Poder Executivo, por uma troca de favores. Essa prática leva ao chamado clientelismo – quando um político encaminha projetos de importância duvidosa, só para favorecer indivíduos ou pequenos grupos. Isso facilita a corrupção, seja para fins pessoais, seja para arrecadação de dinheiro para partidos.
8. O fisiologismo de muitos políticos brasileiros, a falta de distinção ideológica e programática clara entre os partidos e questões quanto à real representatividade do Poder Legislativo são alguns dos fatores que estimulam a pressão pela reforma política.
9. Se o governo quiser promover uma reforma política para alterar o sistema atual, precisará apresentar um projeto para votação no Congresso. E, para isso, deverá contar com uma base aliada sólida que lhe garanta os votos necessários para a aprovação.
10. Mas como a maioria dos deputados e senadores que compõem o Congresso se beneficia do atual sistema, não há interesse concreto em aprovar uma reforma política que rompa com seus privilégios. E, dessa forma, o fisiologismo se perpetua na política brasileira.
Veja também:
Corrupção: entenda por que ela não é exclusividade dos governantes
4 coisas que você precisa saber sobre a delação premiada