Desde o meio desta semana, cidades americanas têm sido palco de uma série de protestos, que têm como bandeira principal o movimento “Black lives matter” (“vidas negras importam”). Minneapolis é o município onde acontecem as manifestações mais radicais e que ganharam mais visibilidade: lojas foram depredadas, saqueadas e o prédio de uma delegacia foi incendiado.
O motivo? Era lá que trabalhava o policial que matou George Floyd asfixiado, nesta quarta (27), depois de abordá-lo por supostamente ter usado uma nota falsificada de 20 dólares em uma loja.
George Floyd era negro. No vídeo gravado por uma testemunha, ele é imobilizado no chão pelo policial, que aperta seu pescoço com o joelho. Antes de morrer, ele repetiu diversas vezes que não conseguia respirar.
Embora os quatro policiais envolvidos no caso já tenham sido demitidos, até agora nenhuma acusação formal foi apresentada, e a impunidade alimenta a revolta de manifestantes que já viram tantos casos semelhantes se repetirem sem consequências no país. O caso de Floyd, na verdade, evoca um episódio muito parecido que ocorreu em 2014, quando Eric Garner repetiu 11 vezes que não conseguia respirar enquanto era estrangulado por um policial, que o abordou por suspeitar que estava vendendo ilegalmente cigarros avulsos.
Infelizmente, os casos não são coincidência: basta olhar o histórico de abordagens policiais que acabaram em mortes no país para concluir que se trata de um racismo estrutural, que permeia as instituições e a sociedade americana. Trayvon Martin, Michael Brown, Walter Scott, Freddie Gray, Sandra Bland e outros são algumas das vítimas de violência policial que tiveram seus casos repercutidos pela imprensa depois de ondas de protestos nos últimos anos.
Muitos outros ficaram marcados apenas nas estatísticas: um levantamento feito pelo jornal The Washington Post revelou essa semana que a maioria dos assassinatos cometidos por policiais no ano passado teve como vítimas afro-americanos. Um outro estudo da ONG Mapping Police Violence revelou que negros têm quase 3 vezes mais chances de serem mortos por policiais nos Estados Unidos do que brancos.
Para entender as raízes do racismo e a violência policial nos Estados Unidos
A herança escravagista, assim como acontece em muitos países, é o ponto de partida para entender o racismo nos Estados Unidos. Colônia inglesa até 1776, os EUA só foram encerrar de vez a escravidão em meados do século 19, com a Guerra de Secessão. Neste texto, explicamos as particularidades do sistema escravagista e da abolição dele no país.
Mas quem pensa que o fim da escravidão representou uma completa mudança na vida dos negros americanos está bastante enganado. Assim como ocorreu no África do Sul, os Estados Unidos também viveram o seu apartheid. A segregação racial instituída pelo Estado, que dividia de escolas a bebedouros para negros, só teve fim definitivo em 1964, com a promulgação da Lei dos Direitos Civis. Para que essa conquista fosse alcançada, grupos de resistência como Os Panteras Negras e ativistas como Martin Luther King trilharam um longo caminho de luta.
O fato é que mesmo que abolidas por lei, a escravidão e a segregação racial no país da liberdade deixaram heranças racistas que se refletem em diversos setores da sociedade americana, seja nos índices de pobreza ou na violência policial escancarada pelo caso de Floyd e tantos outros.
Em 2019, a minissérie Olhos que Condenam, lançada pela Netflix, contou a história de cinco adolescentes negros que foram condenados por um crime que não cometeram. A mesma diretora da série, Ava Duvernay, também abordou a violência policial e o sistema penitenciário racista americano no documentário A 13ª Emenda, que traz dados relevantes para entender a prisão em massa e a criminalização de negros nos Estados Unidos.
No Brasil, um cenário não muito distante
Pois é, vale lembrar que, embora não tenhamos tido um apartheid por aqui, o Brasil esteve entre os últimos países do mundo a abolir a escravidão, em 1888. E a violência policial também é, sem dúvida, uma de nossas heranças escravagistas. A 13ª edição do Anuário da Violência, publicado no ano passado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, revelou que 75,4% dos mortos pela polícia entre 2017 e 2018 eram negros.
A relevância do tema pode colocá-lo na mira dos grandes vestibulares, seja em questões ou no tema de redação. Mesmo o Enem já cobrou, em 2017, uma redação sobre os caminhos de combate ao racismo no Brasil. Confira aqui um texto sobre o assunto já corrigido pelo GUIA.