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Enem 2020 fracassa e evidencia desigualdades

Segundo ex-presidentes do Inep, a aplicação da prova foi desastrosa e estudantes da rede pública foram os mais afetados

Por Wender Starlles
Atualizado em 30 jan 2021, 18h33 - Publicado em 30 jan 2021, 10h52
Candidatos do Enem; enem 2022; segundo dia enem 2022
Candidatos do Enem fazem a prova na Universidade Presbiteriana Mackenzie. (Alexandre de Melo/Guia do Estudante)
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Após um recorde de abstenção de 55,3% de estudantes, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2020 entra para a história como a edição que mais evidenciou as desigualdades entre estudantes, fato que foi ainda mais potencializado pela pandemia de covid-19. Mais de três milhões de candidatos faltaram à aplicação da prova, que foi classificada por ex-presidentes do Inep como desastrosa e excludente para jovens em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Já que eles não poderão utilizar as notas para ingressar no ensino superior.

Segundo José Francisco Soares, ex-presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e especialista em mensuração de desigualdade de ensino, a decisão de realizar o Enem em meio à alta de casos de covid-19 no Brasil foi uma situação do tipo perde-perde. “De um lado há o risco, que não é nulo, de transmissão. De outro, há o impacto na vida dos estudantes que estão se preparando há meses para uma data anunciada”, diz.  

Desde o início, houve erro por parte da gestão do Ministério da Educação (MEC) na preparação do Enem, é o que afirma Maria Inês Fini, doutora em educação e ex-presidente do Inep. Ela lembra que, em junho de 2020, estudantes de todo o país participaram de uma pesquisa promovida pelo MEC sobre o adiamento da prova e optaram por fazê-la em maio. Mas a data foi ignorada pelo ministério. “Em qualquer procedimento básico de pesquisa, você só pergunta aquilo que vai usar”, afirma. 

O processo de autoexclusão das populações mais vulneráveis durante a pandemia foi um dos fatores que mais contribuiu para aumentar o índice de abstenção nesta edição, de acordo com avaliação de Fini. “Isso afetou principalmente os alunos do ensino médio que não têm acesso aos meios de comunicação ou tecnologias mais sofisticadas para o estudo. O Enem foi criado para ser um exame de inclusão, não de exclusão, que foi o que aconteceu”, argumenta.

Charge Enem 2020 de Matheus Ribs
Charge Enem 2020 de Matheus Ribs (Instagram Matheus Ribs/Reprodução)
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Apesar de os microdados da avaliação ainda não terem sido divulgados pelo Inep, já é possível, por meio de relatos, ter uma dimensão do impacto que sofrerá o acesso à educação de nível superior no país. Estudantes da rede pública foram os principais afetados na preparação para a avaliação. A aluna de uma escola estadual do Rio de Janeiro Taynara Soares da Silva, 17, contou que perdeu três meses de estudo porque ficou sem internet, após ter o celular roubado. A ela somam-se muitos outros que desistiram de fazer a prova por não se sentirem preparados.

O país inventou uma nova desigualdade. Quem estava cursando o terceiro ano do ensino médio em escolas públicas foi particularmente afetado. Isso precisa ser tratado. Agora a questão é como atender esses estudantes”, afirma Soares. Ele explica que é preciso considerar a aplicação de diferentes propostas que já circulam, como a adesão de um quarto ano do ensino médio ou novo Enem, para tentar amenizar essas consequências. 

Mesmo com o recorde de ausentes e os problemas de superlotação de salas em 11 cidades, o atual presidente do Inep, Alexandre Lopes, afirmou que foi uma vitória conseguir que 2,4 milhões de estudantes tenham feito a prova. Na avaliação do ministro da Educação, Milton Ribeiro, o Enem foi um “sucesso”.

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“Dizer que houve ‘sucesso’ quando mais da metade dos estudantes não compareceu é uma afirmação que não guarda relação com a realidade”, comenta Soares. Fini também concorda com essa visão. “A declaração do atual presidente do Inep e do ministro da Educação foi uma escárnio com os jovens excluídos desse processo. Este ano tivemos uma aplicação desastrosa”, avalia. 

Ambos explicam que o Ministério da Educação foi omisso em diversos aspectos durante a preparação do Enem 2020. “Se tivéssemos liderança educacional efetiva, os grupos dos dois lados da questão seriam ouvidos e considerados. Nada foi feito. Como se tornou padrão no país. Os responsáveis dizem que não é com eles”, comenta Soares. 

Segundo Fini, faltou a figura de um representante para combinar com as universidades quais seriam as melhores maneiras de adiar a prova ou até mesmo para elaborar um projeto que recupere a aprendizagem ausente na articulação entre ensino médio e superior. 

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Ainda sobre o Enem 2020, o Inep, depois de divulgar o gabarito, mudou as respostas corretas de duas questões que mencionam o racismo. Soares afirma que seria ideal saber onde o processo de verificação da prova falhou. “Me parece correto que, diante de evidências de inadequação, as questões sejam anuladas. Isso é ocorrência comum em vestibulares”.

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Segundo ex-presidentes do Inep, a aplicação da prova foi desastrosa e estudantes da rede pública foram os mais afetados

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