Assine Guia do Estudante ENEM por 15,90/mês
Continua após publicidade

Demarcação de terras indígenas: tudo que você precisa saber

Prevista na Constituição Federal, a demarcação é um direito que garante a preservação da identidade, da cultura e das tradições das populações indígenas

Por Julia Di Spagna
Atualizado em 28 jul 2022, 12h57 - Publicado em 28 jul 2022, 12h15
Demarcação de terras indígenas
Foto: Parque Indígena do Xingu (Wikipédia/Reprodução)
Continua após publicidade

“Uma porção do território nacional, de propriedade da União, habitada por uma ou mais comunidades indígenas, e utilizada para atividades produtivas, culturais, bem-estar e reprodução física, segundo seus usos, costumes e tradições”. É assim que a Fundação Nacional do Índio (Funai), órgão indigenista oficial do Brasil, define as terras indígenas. 

Segundo a instituição, atualmente, existem 680 áreas nesse perfil, dentre as quais 443 estão com os processos de demarcação homologados/regularizados e 237 se encontram sob análise. Essas áreas representam 13,75% do território nacional e estão presentes em todos os biomas, com a maior parte (54%) localizada na Amazônia Legal.

A demarcação das terras indígenas é um direito previsto na Constituição Federal de 1988, que estabelece o limite dos territórios, e dá aos indígenas o direito à posse e uso exclusivo das terras a partir do chamado “direito originário”. Ou seja, por lei, os indígenas são considerados os donos das terras por um direito anterior à criação do Estado, pois foram os primeiros a ocupá-las, e é obrigação da União demarcar esses espaços. 

Além de serem utilizadas para suas atividades produtivas, as terras servem para a preservação da cultura, de tradições e de costumes. Os recursos naturais do território pertencem única e exclusivamente aos indígenas que habitam a região e, para garantir a sobrevivência deles, existem também áreas de caça e extrativismo. Pessoas que não pertencem às etnias indígenas precisam de uma autorização oficial da Funai para acessar estes espaços. 

+ Entenda o papel da Funai

Por que é importante demarcar terras indígenas?

“Garantir esse território, além de ser uma forma de reparação histórica em virtude da violência realizada contra as populações nativas desde a colonização portuguesa, é uma forma de reconhecimento das culturas e identidades indígenas”, explica Rafaela Mateus, autora de História do Sistema de Ensino pH. 

Continua após a publicidade

Além disso, nas terras demarcadas, somente os indígenas podem utilizar as riquezas naturais existentes no solo, nos rios e nos lagos. Isso permite que essas áreas sejam preservadas, pois a utilização dos recursos não é feita em caráter predatório. Assim, são regiões importantes para a preservação do meio ambiente, promovendo benefícios a toda sociedade brasileira. 

Cristine Takuá, habitante da terra indígena Ribeirão Silveira, filósofa e autora do material de cultura indígena da BEI Educação, reforça que demarcar essas terras significa respeitar todas as formas de vida. “Os saberes e fazeres ancestrais dos povos indígenas somente são possíveis se houver floresta, que é nossa escola e onde estão as nossas medicinas. Cuidar desses territórios significa preservar a vida, manter nossa sobrevivência.”

Um estudo de 2016 da Rights and Resources Initiative, junto com a Woods Hole Research Center e o World Resources Institute, apontou que, as terras indígenas contribuem para a diminuição do efeito estufa, uma vez que reduzem o desmatamento. No Brasil, por exemplo, essas áreas possuem o potencial de evitar a emissão de aproximadamente 31,8 milhões de toneladas anuais de dióxido de carbono à atmosfera. 

Outro aspecto positivo, segundo a Funai, é um maior ordenamento fundiário, ou seja, a diminuição dos conflitos pela posse de terras. Com a demarcação, estados e municípios também têm mais chances de atender à população indígena por meio de políticas específicas, além de terem maior controle de áreas vulneráveis e de difícil acesso.

Como funciona a demarcação de terras indígenas no Brasil?

O processo de demarcação de terras indígenas está regulamentado por um decreto presidencial de 1996. A primeira etapa consiste na formação de um grupo técnico especializado, composto por servidores da Funai e coordenado por um antropólogo. Esse grupo de trabalho realiza uma série de estudos de natureza etno-histórica, sociológica, jurídica, cartográfica, ambiental e fundiária para identificar e estabelecer a delimitação do território. Pode ser necessário consultar a comunidade científica ou outros órgãos públicos para embasar a pesquisa. 

Continua após a publicidade

Após a conclusão do trabalho de identificação e delimitação, o grupo técnico apresenta um relatório ao presidente da Funai que, sendo aprovado, é publicado no Diário Oficial da UniãoDo início dos estudos até 90 dias após a publicação do Diário Oficial, os Estados e municípios em que a área que será demarcada têm o direito de pleitear indenização ou questionar, com base em provas, equívocos que possam ter ocorrido durante os trabalhos. Vale destacar que todas as fases do processo de demarcação  contam com a participação do grupo indígena envolvido. 

A Funai tem, então, 60 dias para elaborar pareceres e encaminhar o processo ao Ministro da Justiça, que tem mais 30 dias para declarar os limites da área e determinar a demarcação física. 

Resolvidas as pendências legais em relação aos limites da área, a Funai faz a delimitação física, que, em seguida, é homologada por meio de um decreto do presidente da República. Com isso, a terra indígena passa a ser oficial e a fazer parte do patrimônio da União. 

Histórico das demarcações no Brasil

Estima-se que milhões de indígenas ocupavam o território brasileiro antes da chegada dos europeus. Espalhados pelo território nacional, cada grupo tinha seus próprios traços culturais, línguas e costumes. Com a colonização, ocorreu uma série de conflitos entre estrangeiros e populações nativas, e as terras foram ocupadas pelos colonizadores, enquanto as populações indígenas foram forçadas a se concentrar em áreas de difícil acesso, perdendo seus espaços.  

Segundo Rafaela Mateus, autora de História do pH, o reconhecimento dos direitos indígenas sobre suas terras remonta ao século 17, com a criação do primeiro do Alvará Régio, em 1º de abril de 1680, que reconhecia o direito de posse permanente das terras ocupadas pelos indígenas nas regiões atuais do Pará e Maranhão.

Continua após a publicidade

Em 1775, Marquês de Pombal reformulou a lei ao determinar que esse direito se destinava a todo território colonial. No entanto, segundo a mentalidade da época, os indígenas eram considerados “incivilizados” e, por isso, deveriam ser tutelados. Ou seja, não havia respeito às tradições e aos costumes dos povos indígenas. Com a transferência da corte ao Brasil, D. João VI autorizou o retorno da escravização dos indígenas sob a justificativa de “guerra justa”. 

No período imperial, foram criadas leis pautadas na ideia de que os indígenas deveriam ser “tutelados pela nação” e que representaram a perspectiva de desrespeito às culturas indígenas e à autonomia dos povos em defesa de seus interesses. No século 20, foi criado o Serviço de Proteção ao Índio (SPI), em 1919, que defendeu a integração dos indígenas à sociedade também a partir da ideia de imposição cultural, sob uma lógica catequizadora.

É apenas durante a Ditadura Militar, em 1967, que nasce a Funai, a partir da divulgação do Relatório Figueiredo. O documento denunciava práticas violentas e corruptas de membros do SPI. No entanto, o projeto de desenvolvimento e segurança, pautado na Doutrina de Segurança Nacional, defendido pela Ditadura Militar (1964-1985), buscou incluir os indígenas em um programa de colonização e deslocamento de população para ocupar estrategicamente a região amazônica. “Desse modo, mais uma vez, o Estado brasileiro não respeitou os direitos e interesses das populações indígenas, o que resultou em um grande massacre aos grupos que se opuseram ao projeto político da ditadura civil-militar”, explica Rafaela.

Diante desse contexto, as populações indígenas passaram a se articular em defesa de seus interesses. Em 1980, houve a formação da União das Nações Indígenas (UNI), primeira organização indígena que teve um importante papel na conquista de direitos dos povos originários que foram incorporados à Constituição de 1988. A Carta Magna teve fundamental para assegurar os direitos dessa população, ao estabelecer que o Estado deveria respeitar e garantir a pluralidade étnica no país. A Constituição deu à União a responsabilidade de demarcar e proteger as terras dos povos indígenas.

+ Plebiscito, constituinte e apoio popular: como se faz uma Constituição

Continua após a publicidade

Décadas depois, no entanto, as disputas envolvendo a demarcação de terras e os direitos dos povos originários não cessaram. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal colocou em pauta a tese conhecida como “Marco Temporal”, que determina que os povos indígenas só têm direito a terras ocupadas por eles na data de promulgação da Constituição, em 1988. A votação ainda está pendente. Neste texto, confira em detalhes o que propõe a Tese do Marco Temporal. 

Além disso, fora do campo legal, muitas terras indígenas são invadidas por garimpeiros, madeireiros e grileiros, e têm seus recursos naturais explorados ilegalmente. Segundo uma estimativa aceita pela Funai, aproximadamente 85% das terras indígenas sofrem algum tipo de invasão. 

“Com a Constituição de 1988 tivemos uma expectativa de que os territórios seriam reconhecidos, respeitados e demarcados. No entanto, até hoje lideranças vêm sendo assassinadas e expulsas de suas próprias terras. O agronegócio e a mineração dominam o Brasil e buscam adentrar os territórios indígenas”, completa Cristine Takuá.

Como o tema pode ser cobrado nos vestibulares?

Nos vestibulares o tema pode aparecer, principalmente, nas disciplinas de história, geografia e sociologia. Segundo Murilo Medici Navarro da Cruz, coordenador e professor de Geografia e Atualidades do Poliedro Colégio de São José dos Campos, os temas mais recorrentes são: os diferentes contextos históricos referentes à questão indígena (principalmente a comparação entre o período militar e o da redemocratização), o processo de demarcação, os conflitos a ele ligados, a contribuição das terras indígenas para a preservação ambiental, a violência contra os povos indígenas.  

Dentro desses temas, os estudantes devem estudar: as etapas do processo de demarcação; a localização das terras indígenas (estudar o mapa); as causas da violência contra os indígenas; os interesses conflitantes com a criação das terras indígenas; e a mudança da política indigenista brasileira desde o início da década de 1960 até a atualidade.

Busca de Cursos

Continua após a publicidade

Outra questão que as provas podem explorar são as ações políticas adotadas durante os períodos imperial e republicano para compreender os interesses governamentais e seus impactos na vida das populações indígenas. Também é importante se atentar às resistências indígenas ao processo de colonização e a luta pelos seus interesses. A temática de resistência cultural é cobrada com frequência.

Para se aprofundar no tema

 Prepare-se para o Enem sem sair de casa. Assine o Curso PASSEI! do GUIA DO ESTUDANTE e tenha acesso a todas as provas do Enem para fazer online e mais de 180 videoaulas com professores do Poliedro, recordista de aprovação nas universidades mais concorridas do país. 

Publicidade

Demarcação de terras indígenas: tudo que você precisa saber
Atualidades
Demarcação de terras indígenas: tudo que você precisa saber
Prevista na Constituição Federal, a demarcação é um direito que garante a preservação da identidade, da cultura e das tradições das populações indígenas

Essa é uma matéria exclusiva para assinantes. Se você já é assinante faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

MELHOR
OFERTA

Plano Anual
Plano Anual

Acesso ilimitado a todo conteúdo exclusivo do site

a partir de R$ 15,90/mês

Plano Mensal
Plano Mensal

R$ 19,90/mês

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.