Aporofobia é um termo que tem aparecido cada vez mais no debate público, impactando, inclusive, a legislação. E sim, estudante: também já foi explorado no vestibular. Mas você sabe o que ele significa e como afeta a sociedade?
A palavra aporofobia significa aversão, medo, desprezo ou rejeição aos pobres. De origem grega, é um neologismo e deriva da junção das palavras á-poros (pobres) e fobos (medo) – é a mesma lógica de outros preconceitos, como homofobia ou islamofobia. O termo foi criado por volta dos anos 1990 pela escritora e filósofa espanhola Adela Cortina.
Em entrevista à BBC Mundo em 2020, Cortina explicou que a aporofobia sempre existiu e está nas “entranhas do ser humano”. Isso porque, para ela, o problema é biocultural. A origem biológica se explica pela tendência humana, comprovada pela antropologia evolutiva, de priorizar as relações e pessoas que nos ofereçam algo em troca. Quem não tem nada a oferecer em termos práticos – como seria o caso da população em situação de rua, por exemplo – é instintivamente deixado de lado.
É claro que essa tendência não é imutável: ela pode, de acordo com a filósofa, ser reforçada ou deixada de lado pela cultura. O problema é que vivemos em uma sociedade cujos valores promovem, mais do que nunca, a rejeição aos pobres.
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Padre Júlio Lancellotti contra a aporofobia
Só recentemente o termo “aporofobia” ganhou destaque e passou a ser discutido no Brasil, principalmente pela atuação do padre Júlio Lancellotti, da Pastoral do Povo da Rua, de São Paulo.
O padre é um dos maiores nomes contra a prática e entre suas principais críticas está a arquitetura hostil de espaços públicos que impede ou dificulta a permanência, a passagem e o descanso de pessoas em situação de rua. Seja por meio de grades, pedras ou diversos tipos de estrutura, muitos condomínios residenciais, prédios e estabelecimentos comerciais, como restaurantes e bares, criam barreiras que buscam afastar essa população.
O religioso já denunciou em suas redes sociais uma série de construções que se encaixam nesse perfil.
Um dos casos que mais viralizou foi o das pedras instaladas pela Prefeitura de São Paulo embaixo de um viaduto na zona leste da capital, que impedia que pessoas colocassem colchões ou papelões para dormir na área. Lancellotti foi até o local e quebrou parte das pedras como forma de protesto.
Segundo Lancellotti, é fundamental que haja um programa governamental que garanta moradia para os mais pobres. “Não queremos que as pessoas fiquem nesses locais, mas sim que exista uma resposta humanizadora de acolhimento. Temos que sair da hostilidade para a hospitalidade”, disse o padre em entrevista ao portal ECOA, do Uol.
E vale destacar que não é só por meio da arquitetura que a aporofobia se manifesta. Campanhas voltadas para que pessoas não deem esmola ou façam doações diretas aos mais pobres também são uma forma de propagar a prática. Muitas vezes promovidas por prefeituras, essas campanhas defendem que a ajuda financeira aumentaria o “comodismo” e impediria que os mais vulneráveis economicamente lutassem por condições melhores. Mas Lancellotti também rebate:
“Ninguém pode acreditar que a população de rua aumenta porque aumentou as esmolas, que a esmola é tão rentável que mantém as pessoas na rua. Quem dá esmola é o poder público. O orçamento para a Saúde, a Habitação Pública e a Assistência Social que é uma esmola vergonhosa, que não consegue dar subsistência aos que mais precisam”, afirmou em entrevista ao G1.
Aporofobia na legislação e as soluções para o problema
Em dezembro de 2022, foi promulgada a lei que proíbe construções que visem afastar pessoas em situação de rua de espaços públicos. Em outras palavras, a chamada Lei Padre Júlio Lancellotti define que está proibido “o emprego de materiais, estruturas equipamentos e técnicas construtivas hostis que tenham como objetivo ou resultado o afastamento de pessoas em situação de rua, idosos, jovens e outros segmentos da população.”
Além disso, a lei 14.489, de 2022, altera o Estatuto da Cidade (Lei 10.257, de 2001) e estabelece o “conforto, abrigo, descanso, bem-estar e acessibilidade na fruição de espaços livres de uso público, seu mobiliário e interfaces com espaços de uso privado.”
Nos vestibulares
Por ser algo atual e relevante para a sociedade, o tema pode aparecer nas provas, tanto em propostas de redação quanto em questões.
Foi o que aconteceu na segunda fase da Unicamp 2023. A questão 5 explorou o significado de aporofobia, trazendo uma reportagem com falas de Júlio Lancellotti e imagens que denunciavam a prática. Confira abaixo:
Para se aprofundar
- Episódio “A fome vista nas ruas”, do podcast Saúde é Pública, produzido pela Faculdade de Saúde Pública da USP;
- Episódio “Aporofobia: Rechaço, preconceito e hostilidade ao pobre”, produzido pelo Labjor – Unicamp;
- Livro “Aporofobia, a Aversão ao Pobre: um Desafio Para a Democracia“, de Adela Cortina.
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