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Amazônia: como conciliar preservação com desenvolvimento?

Um projeto recente de exploração de petróleo na foz do rio Amazonas ameaça um ecossistema cada vez mais devastado

Por Paulo Zocchi e William Taciro
29 nov 2023, 10h22
Gado pastando onde antes era floresta (Lucas Ninno/Getty Images)
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Em abril de 2023, o Ibama, órgão do Ministério do Meio Ambiente, deu parecer negativo a um projeto da Petrobras para iniciar pesquisas para a exploração de petróleo em águas oceânicas no litoral do Amapá, região da foz do rio Amazonas. A avaliação é de que havia risco de que um acidente pudesse poluir seriamente ecossistemas únicos no litoral norte. A decisão causou uma polêmica instantânea, opondo alas do próprio Governo Federal e, mais amplamente, setores da opinião pública nacional e internacional. No embate entre ambientalistas e defensores dos ganhos econômicos com o petróleo, emerge uma questão importante para o futuro do nosso país: como harmonizar o desenvolvimento da Amazônia e a melhoria das condições de vida de suas populações com a preservação da floresta e de seus recursos naturais?

Desmatamento zero

Preservar a Floresta Amazônica é uma bandeira de destaque do atual governo brasileiro, fazendo coro a cientistas e ambientalistas que consideram essa diretriz urgente frente à gravidade da degradação da vegetação nativa e das emergências sociais e ambientais que se intensificam no Brasil e no mundo em decorrência das mudanças climáticas.

+ Resumo: a história do desmatamento da Amazônia

Luiz Inácio Lula da Silva (PT), eleito presidente prometendo zerar o desmatamento ilegal no Brasil até 2030, iniciou o seu mandato revogando decretos do governo Jair Bolsonaro (PL) que desmontaram órgãos de vigilância ambiental e estimularam ações ilegais de devastação, como invasões por garimpeiros de áreas protegidas e de terras indígenas.

Em 2023, agentes do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) e do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), órgãos federais de vigilância e de controle ambientais, voltaram a atuar plenamente e, junto com a Polícia Federal e as Forças Armadas, reduziram o avanço do desmatamento na Amazônia em 62% em oito meses: a região havia perdido 7.943 km² de florestas no período de janeiro a agosto de 2022 (equivalente a um terço da área de Sergipe), e esse número caiu para 2.979 km² nos mesmos meses de 2023, de acordo com dados do Imazon (o Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia), que monitora o desmatamento.

A nova agenda ambiental brasileira foi aplaudida por vários governos estrangeiros que defendem a preservação da Amazônia. Entretanto, no Congresso Nacional e em parte dos governos estaduais e municipais da região amazônica, as medidas protetivas enfrentam críticas e oposição de setores que sentem seus interesses econômicos contrariados.

Na Amazônia, há grupos de fazendeiros, madeireiros e garimpeiros que, nas últimas décadas, instalaram-se na região, tornaram-se ativos em sua economia, e são os promotores de um desmatamento descontrolado, atividade que provoca conflitos de terra com povos indígenas, comunidades ribeirinhas, seringueiros, quilombolas e outras populações tradicionais que vivem na região e dependem da preservação do ambiental natural.

+ Entenda como a Amazônia afeta o clima do mundo todo

O cenário de conflitos políticos, sociais e legais dificulta o complexo desafio de evitar o colapso da floresta em meio ao agravamento do aquecimento global, e, ao mesmo tempo, encontrar formas de desenvolvimento econômico e humano para a região.

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Danielle Zaneti, gerente de Sustentabilidade da Petrobras, apresenta o projeto de exploração de petróleo no litoral do Amapá, no Congresso Nacional, em 31 de maio de 2023 (Lula Marques/Agência Brasil)

Quais são as ameaças à Amazônia?

Ao tomar posse, em janeiro de 2023, Lula reconduziu a ambientalista Marina Silva (Rede) à chefia do Ministério do Meio Ambiente (em 2004, ela mesma havia implantado o Plano de Ação para a Prevenção e o Controle do Desmatamento da Amazônia), criou o Ministério dos Povos Indígenas e nomeou a primeira ministra indígena da história do país, Sonia Guajajara (PSOL).

Foram decisões que sinalizaram a prioridade às políticas de sustentabilidade ambiental e de valorização das populações indígenas, em cujas terras há preservação dos recursos naturais. Ao longo do ano, porém, medidas nesse sentido enfrentaram crescente resistência parlamentar da bancada ruralista – uma das maiores do Congresso – e emergiram controvérsias para além das corriqueiras entre oposição e situação, opondo por vezes alas do próprio governo, como o debate sobre a exploração de petróleo no litoral do Amapá.

+ O poder da bancada ruralista no Congresso

A construção de estradas de rodagem e de ferrovias são demandas antigas na região Norte (Roraima não conta com acesso por terra até hoje), importantes especialmente quando a seca impossibilita a navegação e isola as comunidades amazônicas, e essenciais para a melhoria das atividades econômicas. As estradas, porém, são também vias de acesso facilitado para o interior da floresta, determinantes para a sua fragmentação e derrubada. Portanto, a questão de fundo é quais são as alternativas econômicas para desenvolver a Amazônia e melhorar as condições de vida de sua população, ao mesmo tempo preservando a floresta e os recursos naturais. O conceito de desenvolvimento sustentável estipula que a floresta em pé tem valor financeiro maior do que a sua derrubada, e o desafio é concretizar essa ideia.

+ O que significa desenvolvimento sustentável?

Com frequência, fazendeiros, pecuaristas, garimpeiros e madeireiros atuam de forma predatória, pois o seu interesse acaba sendo ganhar o máximo possível de dinheiro em curto espaço de tempo, sacrificando o futuro da região. Essas atividades trazem uma circulação de recursos momentânea nas comunidades locais. Assim, para viabilizar o apoio amplo na região para a ideia de preservação ambiental é preciso que se apresentem projetos rentáveis baseados na manutenção da floresta e na preservação dos ambientes naturais, trazendo recursos que permitam a melhoria de vida das populações amazônicas (com renda, educação, saúde, cultura etc.).

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Por exemplo, na questão do petróleo na foz do rio Amazonas, um ponto é crucial: caso se considere que a prioridade nacional é manter intacto o meio ambiente e que não deve se explorar o petróleo na região, como se poderia compensar financeiramente a economia e a população do Amapá, que ainda pena para sair da pobreza? Dar uma resposta a essa pergunta é um importante papel dos governantes nas esferas nacional, estadual e municipal.

A resposta que o governo de Jair Bolsonaro dava para a região implicava diretamente na devastação da natureza. Em seu governo, o ex-presidente anunciou a reconstrução da rodovia BR-319, único acesso rodoviário a Manaus, aberta nos anos 1970, com 885 km atravessando o meio da floresta a partir de Porto Velho (capital de Rondônia), e que, em vários trechos, consiste hoje num lodaçal gigantesco. Decidiu também avançar com a construção da Ferrogrão, ferrovia entre Sinop (MT) e o porto de Miritituba, em Itaituba (PA), no rio Tapajós, para escoar soja e milho do Mato Grosso e do Pará para a exportação (via navegação pelo rio Amazonas).

Há uma polêmica envolvendo a ferrovia, pois o seu trajeto previsto impacta diretamente terras indígenas, inclusive de povos isolados. Essas questões passaram para o governo Lula, pois esses planos continuam em pauta. O Ministério do Meio Ambiente fez alertas sobre os riscos, mas o Ministério dos Transportes ainda toca os projetos.

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O presidente Lula ao lado de chefes de Estado e de governo dos países da região amazônica, durante reunião em Belém, no Pará, em 8 de agosto de 2023 (Ricardo Stuckert/Presidência da República/Agência Brasil)

Financiamento internacional

Para abrir alternativas com projetos de preservação, o financiamento internacional é decisivo. Pensando nisso, o atual governo brasileiro fez movimentos, como apresentar uma candidatura vitoriosa para sediar a 30ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP-30), em Belém (Pará), em novembro de 2025.

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+ COPs: qual é a importância da conferência do clima?

Em agosto de 2023, Belém recebeu a reunião da Cúpula da Amazônia, com os países da região amazônica: Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela. As resoluções adotadas prometem aliança contra o desmatamento, mas o Brasil ficou isolado com a proposta de meta de zerá-lo até 2030. A possibilidade de iniciar a exploração de petróleo no mar, na foz do Amazonas, por seu lado, gerou a oposição de vizinhos, como a Colômbia.

Internamente, os alertas ambientais soaram outra vez para planos da Eletrobrás de construir mais usinas hidrelétricas na Amazônia. Opositores lembraram os governos anteriores de Lula, que liberaram a construção das usinas de Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira, e de Belo Monte, no rio Xingu, contrariando ambientalistas e prejudicando comunidades tradicionais que, desde o fim da ditadura, tinham conseguido bloquear novos megaprojetos nos rios da Amazônia. Agora, os ecologistas voltam a pedir ao atual governo de Lula o fim das novas usinas na floresta, apontando os impactos sociais e ambientais desastrosos, como a extinção de peixes, a inundação das matas e a dissolução de comunidades.

+ A polêmica da usina de Belo Monte 

Esses apelos ecoam, pois há o compromisso do governo de zerar o desmatamento e adotar uma forte agenda ambiental. A questão mais difícil, porém, é que, para ganhar o apoio da população que vive na região amazônica, é preciso apresentar alternativas de desenvolvimento sustentável para a região. Mesmo sob pressão, a ala ambientalista do governo continua firme, e as demarcações de terras indígenas foram retomadas em 2023.

Os desafios à frente são grandes para a Amazônia e para o Brasil. A preservação da floresta recebe cada vez mais apoio global, e as ações para o barrar o desmatamento também. Os próximos anos são decisivos para que se adotem as medidas necessárias para abrir um futuro melhor para toda a região. Pelo noticiário, você poderá acompanhar isso de perto.

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